quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Para os fortes de coração

Porto Alegre preocupa-me... Permitam-me um momento tocante de sinceridade neste blog. Sim, estou preocupado por perceber hoje até que ponto chegou a miséria nestes pampas. Meu Deus, isso quer dizer que os políticos estavam errados! Oh! Mas eles juraram que a crise econômica não nos afetaria... Juraram. Estavam confiantes. E, depois, quando parecia inevitável, quando ela era já sensível, disseram que estávamos a salvo do pior. Que, como no caso da gripe suína, estavam fazendo tudo que precisavam fazer para que o Povo Brasileiro não sentisse a crise.

Mas, acuso, Porto Alegre sente a crise! Sente em suas pichações... Não há mais tinta para as mesmas reclamações de sempre. Não há mais spray para os bons e velhos xingamentos que enobrecem nossa cidade em paredes e viadutos! Na crise, o gaúcho, demonstrando que se identifica sim com os outros Estados, que é brasileiro!, o gaúcho rebola, inventa na dificuldade, sorri no momento adverso, e apela ao sincretismo! Está por todos os lados: "FORA YEDA E BANCO INTERNACIONAL". Parecem temas afins? Que tal "DERRUBEM AS GRADES E ABAIXO O MACHISMO"? É, a dificuldade é a mãe da invenção, mas não tardamos em dar valor a esse sincretismo, tornando-o a base de uma Nova Crítica, e já passou por mim sujeito andando veementemente para seu destino E cantarolando bem alto músicas contra nossa governadora.

Faz sentido. Faltando dinheiro, a pessoa caminha apressada para suas obrigatoriedades, mas não deixa de recitar a cantiga para fazer finalmente a Revolução pela Arte. "Banco Internacional" é tema de nossas pichações há séculos, e, como todo texto é um jogo de renovação e repetição, junta-se o político do momento à mesma reclamação de sempre. E num mundo em que não há detentos, jardins protegidos, canis, proteções de campo, há espaço para machismo? Claro que não!

Pois vejam, eis que a crise econômica, ao chegar na capital gaúcha, inspira a sensibilidade estética que une os problemas a fim de que não se deixe de pichar nem se mude de discurso. Conscientes, porto-alegrenses inclusive escolhem em massa o pretinho básico para escrever por sua cidade. Mais barato que as "cores", ao que parece, o preto tem ainda a vantagem de combinar com tudo: monumentos, viadutos, pedras nas vias, corredores de ônibus, casas alheias... E, uma vez desgastado, não se torna mais um texto que nos atiça a curiosidade, mas que não pode mais ser lido. Apenas parece mais uma mancha de poluição, o que nos reconforta na familiaridade.

Emotivo, compartilho aqui que as pichações da bela Porto Alegre estão sob rígido sincretismo de ideologias - não confundir com sincretismo ideológico. Não, não. Este exige trabalho cerebral, esforço dialético em que ideologia + anti-ideologia = vácuo de ideias, também conhecido como Missão Editorial no Jornal O Sul. Não, sras e srs, "sincretismo de ideologias" é o bonito e impressionante fenômeno que ocorre quando finalmente alguém conta para o pessoal que só sabe tirar palavras de ordem do bolso que existem dois destes em cada calça!

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