segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

O espírito da boa-vida

Quebrando o jejum de fim de ano, preciso publicar esta frase, grande definição ambivalente para férias, recessos ou descansos:

"Eu adoro esse nosso mundinho de pernas pro ar."

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Frase do dia

"Até 2011!"

Continuidade e coerência na Câmara Municipal

Lembram da algazarra referida no post sobre o IPE e a fundação pública de direito privado (segunda-feira) que serviria para atender a famílias (considerado ilegal em seu equivalente federal, mas tentado aqui assim mesmo)? Lembram que a data, para a continuação da discussão, informada na hora era quarta, mas o site da Câmara Municipal de Porto Alegre indicava quinta?

Pois bem: "A Câmara Municipal de Porto Alegre aprovou, na sessão desta quarta-feira (22/12), o requerimento do vereador João Antônio Dib (PP) para a votação, em regime de urgência, do projeto que cria o Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família (Imesf)."

E o IPE? Ficou para ser votado no dia 30 de dezembro. O que o pessoal da oposição tinha pedido? Que ambos os projetos fossem considerados em debate público, o que quer dizer grande público ou, no mínimo, grupos de representação social - em oposição ao troço ser empurrado rapidinho enquanto ninguém está olhando. Votar o instituto dois dias depois de uma manifestação daquelas e o IPE em 30 de dezembro gritam "debate público", vocês não acham?

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Nós na quadra - e o mundo de pernas para o ar

"Peguem a bola e joguem futebol."

O famoso resumo maldoso do que seria uma aula de Educação Física há algum tempo me atraía - para fazer na minha aula mesmo (Port/Lit/Red). Aqueles seres humanos que mal entraram na adolescência têm tanta vontade de se mexer simplesmente por fazê-lo (ou só não enxergam como seria uma existência sem movimentos bruscos e constantes) que eu vivia pensando em formas de adotar isso em Português ou simplesmente armar um esquema que me permitisse largar a frase acima e deixá-los só se mexer, um dia sem textos ou mesmo pensamento sobre linguagem nem no horizonte mais distante. Nada de reler o jogo como uma atividade estruturada ("indicando uma sintaxe") nem de pensar que ali também comunicação é fundamental. Não! Joguem futebol, e vôlei, e fim (sem querer aludir, por "fim", à estrutura narrativa).

Hoje pude realizar essa vontade. Na verdade, meu alívio foi tanto por tudo ter dado certo para isso que eu não falei nada. Joguei as bolas de cada jogo de longe, para que chegassem ainda antes de mim, e eles imediatamente começaram a se organizar.

Infelizmente, como não poderia deixar de ser, a coisa não foi tão simples. Não permitir que certas atividades paralelas fossem realizadas (sendo que eu, diferente de um professor de Ed. Física, nem precisava insistir para que todos realmente jogassem, deixando uma gurias ouvir suas musiquinhas e falar sobre as últimas incríveis novidades), fazer os chatos respeitarem regras e brigar com os alunos de outras turmas que resolveram aproveitar o clima de licenciosidade do fim das aulas para atrapalhar o jogo dos menores, todas foram incomodações suficientes para eu confiar que não curtiria dar essa aula de verdade, ainda que tenha a vantagem de ser uma matéria que envolve tanto exercício e agitação. Fazer os alunos assim soltos pensarem sobre determinadas regras e atividades diferentes, conter os pedidos insistentes por futebol ao longo do ano todo e motivar as lesmas crônicas... não deve ser fácil.

Mas não adianta: foi ótimo fechar o ano podendo (contra as minhas suspeitas) realizar finalmente essa ambição.

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Business as usual in POA

Fernanda Melchionna (PSOL) - Eu queria pedir que o presidente da mesa pedisse aos seguranças respeito às pessoas lá atrás, que estão apenas se manifestando.

Nelcir Tessaro (PTB) - Justamente, a vereadora Fernanda Melchionna pede que as pessoas lá atrás tenham respeito pelos presentes e parem com as manifestações.

Microfone da Fernanda fica mudo.

Adoraria poder postar as palavras perfeitas aqui, mas reproduzo de cabeça. De qualquer forma, a inversão acima ocorreu e pareceu resumir como se levou a tarde de hoje na Câmara Municipal de Porto Alegre. Havia interesse hoje que fosse votado, após alguns séculos de pedidos de professores, que o IPE também beneficiasse os professores municipais. Isso atraiu mais gente à Câmara, bem como o pedido de uma CPI que enfim saía, depois de se ter conseguido arrastar sua verificação ao longo de todo o 2010. 

A votação do IPE ficou atrelada a uma proposta de fundação pública de direito privado na Saúde. O que se disputa, nesse caso, como sempre, é se isso não viola o dever do Estado de cuidar da saúde de seus cidadãos. A CPI tinha por objetivo investigar desvios na Secretaria de Saúde. Vê-se bem que tudo se cruzava. Complicando o pedido de CPI, surgiu uma picuinha, trazida por um "à parte" (não lembro bem de quem do PSDB), mas logo defendida por João Dib (PP), sobre uma assinatura. Tudo isso ainda que nada pudesse ser feito, pois, como informou logo de início Mauro Pinheiro (PT), que recebeu o pedido de CPI, a Câmara só podia pegar e encaminhar o processo para ser julgado em instância adequada. Mesmo assim o pessoal curtiu gastar tempo debatendo se uma das doze assinaturas era válida, o que de fato era, conforme os motivos levantados logo na primeira vez em que incomodaram com isso, tudo agravado pela discussão ser inútil, já que, como de início se informara, nada poderia ser usado para anular o pedido naquele momento: só estava sendo encaminhado...

Para piorar os ânimos, Reginaldo Pujol (DEM) encarnou a mais ancestral demagogia, falando de seu interesse em votar pela vantagem do cidadão, mas indicando que a votação favorável ao IPE destruiria o Hospital Porto Alegre, responsável por cuidar da saúde dos funcionários municipais (ainda que seja incapaz de fazê-lo e todo mundo saiba disso - ah! e além de isso não ser a consequência necessária). Seu discurso conseguiu (o que em si é triste, pois denota a burrice geral nessas lutas por interesses diretos) virar parte dos servidores municipais contra outros.

Pujol foi vaiado e ouviu de tudo num pronunciamento que deveria durar 15 min, mas passou dos 30 com certeza. Isso porque o relógio precisava ser parado de tempos em tempos por gritos e protestos. O que acontece é que, desde que a questão da saúde fora primeiro levantada, 6 pessoas se manifestavam no fundo da "plateia" da Câmara. Os seguranças iam e vinham e houve todo tipo de discurso sobre democracia e liberdade. Conforme as questões acima se desenrolavam com discursos animados e distorções retóricas "vazias", a manifestação dos seis já era a de toda uma ala do salão. Basicamente, todo mundo foi sentindo pra onde a merda ia, e começou a vaiar ou criticar quem colocava em termos IPE vs. HPOA ou quem defendia que a iniciativa privada faria maravilhas pela saúde da população carente. É bem verdade que Pujol também piorou a situação se fazendo de santo e de sensível em seu pronunciamento (no sentido literal dos termos).

Entre os pronunciamentos dos vereadores, foram ganhando mais e mais apoiadores os gritos contra a terceirização de serviços da Fundação, a favor da CPI e em defesa do IPE, até que o lugar virou um senado romano: todo o mundo sentado à esquerda de quem entra na sala gritava contra certos vereadores e determinadas medidas, todo o mundo sentado à direita (majoritariamente servidores do Hospital Porto Alegre) gritava contra quem estava à esquerda. As diferentes propostas se agregaram em duas posição que rejeitavam ou apoiavam um bloco de medidas.

No fim, não aconteceu nada de muito terrível, e a votação sobre a Fundação ficou para quarta-feira, ou quinta (o site informa diferente do que foi dito na hora). A CPI estava encaminhada e o próximo passo no drama do IPE é um mistério.

Foi com isso que se acalmaram os ânimos gerais. Quando foram para lá, os vereadores de oposição pretendiam conseguir que se passasse "IPE e Fundação" para 2011, ou seja, que se permitisse que tais projetos fossem debatidos publicamente e não resolvidos às pressas como estavam sendo encaminhados, correndo durante as Festividades de Ano Novo, como é tradicional na política. A Câmara jogou isso para outro dia (quarta/quinta), esquivando-se assim dos manifestantes (exigindo que o pessoal - ou mais gente - se mobilize ainda na outra tarde ou, de preferência, nem "venha encher o saco e desrespeitar a casa"). O problema, enfim, não foi resolvido pelos seguranças.

Enfim, foi durante o vai-não-vai da segurança que Fernanda pediu o respeito aos manifestantes (no sentido de que eles não fossem movidos à força, não que não se pedisse silêncio), e o presidente da mesa, presidente da Câmara de Porto Alegre, inverteu as palavras dela e não permitiu que ela novamente se manifestasse. 

Estamos bem em Porto Alegre.

domingo, 19 de dezembro de 2010

OAB - Prova pra quê?

Há quantos anos se tenta derrubar o exame da OAB? Os critérios variam (e o atual de isonomia é péssimo), mas uma coisa não muda, o problema do exame: reprovar mais do que aprova. E por que isso acontece? Em parte porque ele é voltado a certo tipo de formação e não a outras? Muito provavelmente. Essas outras são melhores que a escolhida? É discutível. Existem críticas a esse tipo de formação, dizendo que alguma das "outras" seria muito melhor? Claro. Agora, quando todas essas afirmações não são verdadeiras a respeito de qualquer prova? É esse o problema do exame da OAB? Que seja uma prova?

O pecado da OAB não é metodológico, porque isso reformas resolvem (e suspender megalomaniacamente o exame da noite para o dia não é uma reforma sensata), seu pecado é estrutural: propor uma avaliação que tem exigências altas, que pode sim reprovar mais que aprovar, já que essa discrepância quer dizer que existem determinados critérios (discutíveis como quaisquer outros) e que estes critérios não podem ser dobrados apenas por uma choradeira esparrenta nem por choramingos, sem método nem validade legal (mas não significa que alguém do Estado não possa agir dentro do sistema legal para respaldar tais choramingos - e o interesse de alguém, especificamente). Toda prova pode ser reformulada ou questionada, o que é muito diferente de achar que "Pai, eu queria ter passado e não passei" vale derrubar todo um sistema. 

É extremamente ridículo e preocupante que tantas pessoas "formadas em Direito" (índice irônico da qualidade dos cursos que abundam no Brasil, o que só reforça o argumento da OAB que é preciso ter critérios para deixar essa gente agir com o poder que o Direito traz) achem no entanto que seu choramingo pessoal, reforçado pela comunidade dos tristonhos, mas não por uma crítica razoável, seja argumento para uma decisão como a do desembargador Vladimir: "Simplesmente suspende tudo porque eu descobri, depois de séculos, que a tal prova não garante isonomia" - como é que o  Haddad não pulou na imprensa e veio falar sobre a "tecnologia de ensino" dessa vez?

Tudo isso é preocupante e ridículo, como disse, mas não de se estranhar. Existem apenas dois âmbitos em que provas têm algum valor discriminatório (sua raison d'être, vamos combinar): concursos e OAB. É infinitamente mais difícil entrar numa instituição pública do que sair dela diplomado ou desfrutar da vida lá dentro, em caso de emprego. E isso por um motivo simples, não há lugar dentro das instituições públicas para todo mundo. Portanto, mesmo que se queira "auxiliar a sociedade" abraçando todo mundo, não tem como colocar todos os brasileiros dentro do Estado, econômica e fisicamente falando. As cotas tentam mitigar isso um pouco, por diversos motivos que não interessam aqui, mas mesmo assim a competitividade é necessária, de modo que a luta entre concorrentes torna a prova discriminatória.

Todas as outras "provas" brasileiras são contornáveis, por amizade ou por choramingo. As exigências do Estado em quaisquer outros âmbitos podem ser resolvidos com choro (particularmente poderoso pela vontade política de se mostrar números de aprovação e porque os níveis educacionais sempre foram tão baixos que qualquer variação mínima já parece grande coisa). O QI (Quem te Indique) resolve quando não se tem conteúdo ou valor para um emprego privado (e de alguns públicos também). No caso de cursos privados, quem paga manda, de modo que não se pode ser reprovado quando se é o cliente/chefe. Parece-me que, nesse quadro todo, prevê-se que os ricos e pobres se dirijam a seus respectivos empregos-clichê e tudo siga numa boa, com a educação de qualidade sendo adquirida das formas paralelas usuais ou por sorte e esforços isolados. Quando a competitividade e/ou o talento provoca mobilidade social, há sim conflito, geralmente muito, mas essa briga é um tanto localizada, resolvida caso a caso, às vezes de forma injusta e às vezes não.

A OAB é um grande choque nesse sistema, porque tanta gente não passa que escandaliza uma parcela violenta de pessoas que nunca viram na vida ser posta em prática uma lógica de discrimanação baseada em critérios explícitos e socialmente validados (o que não quer dizer que essa validação não seja questionada e conflituosa). Essa galera considera a coisa toda fora desse mundo, absurda, injusta. A recente discussão no MEC para que os primeiros três anos de escola não possam envolver reprovação alguma é apenas o último desenvolvimento de uma política que quer ser construtiva ignorando a inteligência das crianças, que aprendem muito mais pelo que fazemos do que pelo que dizemos. Não adianta a educação brasileira ser retoricamente criteriosa se é pragmaticamente permissiva. Todo mundo aprende: exigência é discurso, na prática todo mundo passa.

Não é à toa que a OAB enfrenta tantos problemas para manter essa prova e concursos dominam a imaginação de tantos brasileiros. Nesses dois momentos especiais tudo o que se diz sobre competição e qualidade, e que nunca foi verdade na vida do aluno, torna-se realidade, dura realidade. E o choro ou a falcatrua, que funcionaram até então, precisam funcionar agora também. Basicamente o que os proto-advogados dizem ao questionar a própria existência do exame é "o teatro da educação foi mantido até aqui, e não é agora, no limiar do meu mercado de trabalho, que vocês vão levar a farsa a sério".

A resistência a toda essa lógica parte de profissionais e alunos que se negam a aceitar a mesma, os corruptores envolvidos no próprio sistema que tentam miná-lo em nome de outro tipo de educação, ainda que devendo se dobrar a ele de tempos em tempos. Isso não muda o fato, no entanto, de que o sistema em si é aberto a quem vier (não confundir com inclusivo). O grande denominador comum, o mercado, depois se encarrega de achatar todo mundo a uma impessoalidade que deixa com o rabo entre as pernas os despreparados e sem amizades bem colocadas. O mercado, no entanto, é uma força sem centro nem rosto. A única solução é aderir apaixonada e acriticamente a bandeiras anti-burguesas (não supondo que não seja possível ter postura semelhante e senso crítico) ou usar o mercado como desculpa para discursos autocondescendentes que informam desde aproveitamentos ilícitos da assistência social até o tráfico. 

A OAB, entidade bem localizada e localizável, é por isso mesmo diferente do mercado, trata-se de um alvo que pode ser clara e diretamente atacado. Apesar de não gostar de fazer afirmações tão amplas, parece-me mesmo que a derrubada efetiva de tal exame será o passo final de uma revolução no Brasil inédita: o fim da institucionalização dos critérios. Como a norma culta, em oposição à norma padrão, a competição entre profissionais terá se tornado puramente social, ou seja, ditada por regras complexas e esquivas, geralmente de difícil percepção clara, o que dificulta infinitamente sua contestação e enfrentamento. Além disso, terá se formado um país inteiro de pessoas que esperam resolver tudo no choro ou no grito, mas nunca numa representação de que façam parte ou em que se organizem. Existe já alguém para patroná-los, o Estado ou o rico. A resistência a essa lógica restará localizada naqueles grupos que educam seriedade e dedicação, casos isolados e mitigadores de um sistema que não quer educação, e atinge esse fim não tendo critérios.

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Rosto amigo de longa data

Há alguns meses sou colega de trabalho da professora que me deu aulas na quarta série, o que é muito legal porque nossa turma simplesmente adorou essa professora. E vê-la com olhos adultos de forma alguma revelou algum detalhe ou defeito que tivesse nos escapado quando crianças. Ela é competente e legal como parecia na época, dadas as devidas proporções de entendimento desses conceitos, claro.

Mas só hoje fiquei sabendo que ela, quando me deu aula, tinha a idade que eu tenho agora. Lembrei, é claro, da piazada que vejo no colégio e fiquei remoendo minha sorte de não ter de dar aula para eles adicionando a isso a ideia curiosa de que eu sinto quase um alívio por não ter de dar aula para mim mesmo naquela idade, por mais "fofinho" e "querido" que todo mundo diga que eu fosse. Não é tanto a questão estética, é que me imaginar como um daqueles seres que correm pela escola destaca o quanto me assustaria a responsabilidade de dar aula para mim mesmo. Eu não ia querer me traumatizar, nem me cercear (não na hora errada), ou me confundir, muito menos atrasar o meu desenvolvimento de qualquer forma que fosse. Eu posso ter dado muito errado... por outro lado, talvez este meu eu seja o melhor eu possível (com o que Leibniz concordaria, pelo menos), o que significaria que eu teria muita pressão sobre mim se tivesse de cometer o potencial acerto outra vez.

Felizmente eu não posso nem nunca quis dar aulas para a piazada em questão (e igualmente feliz é o fato de que a teoria acima só poderia ser comprovada às custas de perigosas experiências de física quântica, as quais não posso custear), só que não pude deixar de pensar numa coisa: se eu tenho a idade que ela tinha na época, e se eu fosse um daqueles piás de quarta que vejo na escola, em 2012 "eu" chegaria à série mais fundamental das fundamentais em que de fato leciono, a sexta. Em 2012, eu me encontraria como professor com meu eu aluno... Daqui a dois anos, eu chegaria a mim.

O que, pensando bem, não seria problema algum. Sou objetivo como professor como era como aluno. Seria legal chegar em aula e saber imediatamente que não entraria em confrontos ideológicos e metodológicos pelo menos com aquele aluno. Apesar de que eu tinha, com certeza, uma característica da idade que, como professor, devo admitir que é detestável em qualquer aluno: a narcísica e paranoica timidez adolescente, quando a questão é participar de algo que é proposto por adultos - ainda que o adolescente queira participar, no fundo. Será que eu encontraria a linguagem certa para falar (falar de verdade, e como adulto) comigo naquela idade? Seria mesmo este o melhor caminho para aprender a falar com os outros?

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Diga-me com quem andas...

Só um capítulo nele é meu, mas é bom encontrar um livro com meu nome pertinho da obra do Nietzsche numa livraria.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Porque viver é contraditório

"Então ele viu a luz e subiu a escada da vida"

Da série Eufemismos imprevistos de adolescentes para matar seu protagonista.

domingo, 12 de dezembro de 2010

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Hitler, 11/9 e respeito (a)religioso?!

A ATEA é a Associação Brasileira de Ateus e Agnósticos. Com certeza não usam a sigla ABAA para não serem confundidos com o ABBA. Preferiram o trocadilho que descarta de sua sigla tanto o "Associação" quanto o "Brasileira" - o que pode ser boa notícia.

Pois bem, os caras inventaram uma sandice sinceramente assustadora. Resolveram começar uma campanha em ônibus de Porto Alegre e Salvador (anunciada hoje e hoje mesmo barrada nas duas cidades - começam as apelações legais) tentando "combater o preconceito contra ateus"! Eu preciso comentar: HEIN?!

De onde poderia vir tal sandice? Ora, de onde saem todas as campanhas sociais que não fazem sentido em solo brasileiro? EUA! Na verdade, a campanha é originalmente inglesa, mas o nosso formato é o americano. Por que digo isso? Porque o próprio discurso dos defensores da campanha é O MESMO (específica e literalmente) que ganhou a grande mídia deles mais ou menos por 2007, quando uma campanha anti-clerical e anti-religiosa (baseada na argumentação de que acreditar em Deus é sempre e unicamente a mesma coisa que acreditar no BogeyMan, organizada institucionalmente com o mesmo motivo, "educar" pelo medo) engrandeceu-se ainda na onda da Guerra contra o Terror. Claro, talvez a coisa tenha até surgido antes, não posso dar certeza de algo do tipo por motivos óbvios. Já a campanha dos ônibus, que é o que começou na Inglaterra, data de 2009.

Aqui está o que estou comparando com o discurso norte-americano, a "argumentação" de Daniel Sottomaior, presidente da ATEA:

"Somos cerca de 2% dos brasileiros, ou 4 milhões de ateus. Mas muitos têm medo de se expor devido ao preconceito de amigos, chefes e familiares. Isso tem que acabar."

O que os defensores do anti-religionismo americano diziam? Exatamente as mesmas palavras com uma interessante diferença: eles computaram ser 20% da população norte-americana. Eu sei que não sou grande matemático, mas me parece ter alguma diferença significativa entre 20 e 2%. Não que alguma porcentagem da população mereça sofrer preconceito, mas, francamente, QUE preconceito ateus sofrem no Brasil? O discurso condescente de algum religioso, a pregação chata de algum crente/fantático (nada que não precise aturar de vez em quando de certos vegetarianos ou militantes), SE quiser ficar para ouvir? A ATEA tem o registro de algumas dessas manifestações "anti-ateias", frases descontextualizadas e torcidas na leitura com os melindres hipócritas usuais dos politicamente corretos. Francamente, eu odiei aquele envolvimento da religião na campanha eleitoral, mas como eles podem, tão perto daquilo, querer dizer que quem sofre preconceito são justo os ateus, os únicos que não foram xingados numa complicação que envolveu de argumentação política a "ódio aos reacionários religiosos"? Não me entendam mal: eu achei que a luta presidencial (ou "briga de travesseiros", como foi bem descrita) só piorou porque foi posta em termos religiosos, e sim a campanha anti-religiosa americana sai de uma esquerda mais à esquerda que os Democratas (deles!), única fonte de algum discurso político norte-americano com o qual sinto conseguir concordar em geral. Mas, por favor, espírito crítico, pessoal!

Não acho que eu tenha passado até aqui o que mais me irritou na campanha, que não é o problema de porcentagem nem a coisa do preconceito que não me convence, então pense-se no que se falou a favor da campanha, que ela seria pela luta contra o preconceito, e vejamos a foto abaixo:


Ao lado dessa imagem há uma foto de Chaplin, que não consegui, com a legenda "NÃO ACREDITA EM DEUS". Depois desses exemplos, como a frase "Religião não define caráter" pode compensar o jogo de imagens? Ou mesmo convencer quando o exemplo mais facilmente é lido indicando o contrário? Não parece um exemplo tão granve? Outro cartaz mostraria a imagem de um avião acertando o World Trade Center com a frase "Se Deus existe, tudo é permitido", trocadilho com a frase do "Irmãos Karamazov". Outro detalhe importante, a frase era de que tudo é permitido se Deus NÃO existe. Intertextualidade com livro que ninguém leu? Muito educativo... Quase tanto quanto resumir "religião" usando atentados terroristas!

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Operário em construção

Após ouvir quatro marxistas falando por várias horas sobre pesquisa universitária, só posso dizer uma coisa: existe uma dialética entre meu emprego e meu doutorado, e o problema é que EU não sou a síntese.

Australian responsibility

Na terça eu fiz um post sobre as pessoas tomarem a responsabilidade para si daquilo que fazem e na quarta já vi um exemplo que muito me agradou exatamente disso. Infelizmente não pude publicar, mas aqui vai:

Existe um ditado de língua inglesa que eu odeio, particularmente porque reconheço como a normalização de uma retórica de encobrimento, que é "stats don't lie". É claro que a coisa se espalhou e é usada em português em geral na forma "números não mentem". Pois bem, eu vi uma defesa de um australiano em que ele chegou a subscrever o ditado (sua cultura), mas conseguiu ao mesmo tempo tomar a sua devida responsabilidade pela leitura dos dados apresentados, que é realmente o que importa. Ao ser criticado pelo uso de determinadas estatísticas, diretamente pelo risco que esse uso geralmente acarreta, ele começou sua resposta assim:

"Números não mentem. Pessoas mentem. Se existe alguma minha mentira aqui, ela é minha."

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Eu podia tá roubando...

"Eu podia ter simplesmente dito que não era minha responsabilidade e deixado sem fazer..."

Podia mesmo? Se a pessoa é coagida, por chantagem, força ou cobrança institucional de algum tipo (geralmente uma sublimação das duas formas anteriores), então "podia" coisa nenhuma.

Mas se a coisa não chegou nesse ponto, ou não precisou chegar lá? Então a pessoa agiu por sua própria consciência. Ora, se foi isso, então a pessoa, muito teoricamente, "podia" sim ter feito outra coisa, mas decidiu não fazer. E se decidiu, decidiu. A menos que a criatura seja uma criança, estando a coerção violenta descartada, sua decisão é de sua responsabilidade. Os outros podem ser gratos... ou não. 

Mesmo um de nossos heróis populares mais queridos disse "não faça aos outros o que não queres que façam contigo", e não "não faça aos outros para que não façam contigo". A cobrança pelo reconhecimento de nossas boas ações (sejam verdadeiramente isso ou não) indica um pressuposto de que a bondade exista numa relação de crédito metafísico, de que o bem é premiado com o bem; ou, pior ainda, de crédito humano, que implica seres humanos que reconheçam o que recebem por bem. Não é a melhor descrição da raça nem dos deuses. O choramingo de "eu podia ter..." não faz sentido. A responsabilidade por fazer algo, bom ou ruim, é nossa. Os outros são agradecidos quando querem, se querem. 

Fazemos o bem porque queremos, portanto fazemos o bem por nossa conta e risco. Ou não façamos.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Honra, pra que te quero?

"Eu vou falar. Ela não tá aqui agora, mas tudo bem, porque se tivesse eu falava também, porque eu não tenho problema em falar na frente..."

Vocês não reagem com desconfiança quando alguém faz esse tipo de apresentação? Agora, mesmo que a pessoa esteja sendo sincera, sendo realmente capaz de se expôr caso a dita ausente estivesse presente, qual o mérito de se jactar da coragem de fazer um ato burro? Ora, certas coisas se diz pelas costas ou não se diz, porque falar bobagem pelas costas pelo menos tem menos consequências do que a besteira de se dizer o que não se deve na frente da pessoa. Claro, se expor pode parecer honra ou coragem, mas ambas só fazem sentido numa sociedade que seja informada por esses valores. Não é o caso da nossa (aviso caso o leitor nunca tenha ouvido falar em dinheiro).

Certas coisas nós não seguramos, precisamos dizer, mas isso sai muito mais por questões de nossas personalidades do que verdadeiramente de um sentimento de honra, e, nesses casos, acabamos dizendo na hora errada mesmo, não anunciando que o faríamos caso a hora errada se apresentasse. Valores ou obsessões tão firmes quase que agem por si e não implicam burrice tática. E é claro que a honra pode ser algo válido e muito bonito em determinadas situações, particularmente quando leva a comportamentos construtivos ou a besteiras de pouca relevância social ou monetária, mas no auto-elogio é muito mais fácil encontrá-la encobrindo não apenas vaidade, mas burrice.

sábado, 4 de dezembro de 2010

O "S" e o infinitivo

Eu observo há um tempo um erro padronizado de alunos com determinada incompetência de escrita: escrever verbos no infinitivo com "s" no fim, em vez do "r". Não estou falando de gente que tem um "r" que parece um "s" simplesmente, mas de pessoas que real e nitidamente escrevem o último no lugar do primeiro. 

Não é algo restrito a idade nenhuma, nem mesmo a se estar ou não no Fundamental, mas as pessoas que cometem esse erro parecem ter mais ou menos o mesmo nível de trato com a língua. O assunto me chamava a atenção, mas o pouco esforço que eu dedicava a descobrir o motivo nunca me levou a solução nenhuma. A maioria dos professores com quem comentei não parecia ter notado o padrão, apesar de lembrarem de uma série de casos assim que eu colocava claramente a questão para eles. Desatentos, eles não tinham nenhuma teoria adequada a oferecer. Os poucos que tinham notado o fenômeno me diziam que também ficavam intrigados, mas só conheciam respostas genéricas para a coisa, centrados na solução: lerem mais, contato maior com escrita, mais exercício...

Há uns dias, no entanto, me veio uma resposta óbvia. Não sei se real, mas logicamente simples: "s" é a letra que some. O aluno que já sabe que os verbos ditos com vogais fortes tônicas no fim (o que é percebido intuitivamente, claro, não assim como estou dizendo) - "voltá", "comprá", "vendê" - são escritos com uma letra no fim, colocam imediatamente o "s" porque, como eu disse, essa é "A Letra que Some".

Como assim? Explico: como é que se diz "As casas brancas do Brasil"? Ora: "As casa_ branca_ do brazil". Notaram como essa letra estranha aparece na escrita, mas praticamente não ocorre na fala se está no final da palavra? Aliás, o "s" é uma letra tão estranha que às vezes tem som de z, como no Brasil, às vezes se duplica, além de poder se combinar com outras, como "c" ou "ç".Se o aluno sabe que "vou comprá" precisa ser escrito com uma letra no fim de "comprá" e já sabe, por outro lado, que "s" aparece no fim de palavras mesmo não sendo pronunciado, "s" é a letra óbvia para o fim do infinitivo.

É claro que não estou supondo que o raciocínio se dê dessa forma na mente da pessoa. Imagino que aconteçam aqueles fenômenos curiosos e semi-conscientes de pessoas que estão desenvolvendo certa compreensão regular da língua, mas ainda não captaram bem a ideia para colocar as exceções em seus devidos lugares. Enfim, essa viajada toda pode ser uma bobagem, mas resolvi escrever aqui a hipótese para talvez alguém me dizer que "sim, Fulano e Ciclano já mostraram isso", ou pelo menos para propor a ideia para outros professores caso Fulano e Ciclano ainda não tenham dito nada disso. Nesse caso eu deveria ter patenteado este post.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Fechados na Terra

Conforme a pesquisadora da NASA Mary Voytek, sobre o ser vivo cujo sistema usa arsênico em vez de fósforo para funcionar, "Temos que pensar em possibilidades de encontrar vida que aguentam coisas que não conseguiríamos aguentar".

Ora, eles estavam procurando vida fora da Terra e só pensaram nisso AGORA?

A temida promessa de paz

Não conheço ninguém que more no Rio, mas as manchetes das principais revistas e jornais são um indício estranho do medo envolvido nessa situação toda. Não o medo de que o ataque pegue novos inocentes, mas o medo de que o enorme retrocesso do poder geográfico dos traficantes seja apenas um vislumbre passageiro de uma situação que poderia ser melhor. Manchetes como a da Isto É, "O Rio é maior que o crime" (mas não só ela), soam mais como tentativas de autoconvencimento do que puras palavras de ordem ou, digamos, constatações de fatos comprovados. Não parecem apenas um jogo com as esperanças do leitor, mas uma aposta temerosa dos próprios jornalistas (ou de seus contratantes). Como uma criança no escuro tentando se convencer de que não tem nada mesmo debaixo da cama. E se tiver?