domingo, 16 de dezembro de 2012

Uma citação, pra recuperar o hábito

"Without science, everything is a miracle. With science, there remains the possibility that nothing is. Religious belief in this case becomes less and less necessary, and also less and less relevant." Lawrence M. Krauss - A Universe from Nothing

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Matando o democrático

Algumas palavras deveriam morrer imediatamente; serem assassinadas e ponto. A palavra "democrática" é uma dessas. A democracia não deve, espero que não morra; ou, para os pessimistas, espero que continuemos brigando para ter mais e mais democracia, apesar de não haver um exemplo perfeito desse ideal...

Enfim, apesar do valor da democracia, chega desse termo. Ele virou bandeira, o que significa que desponta por todos os lados, nos discursos mais cotidianos e babacas, bem como tornando discursos importantes em coisas cotidianos e babacas também. Quando as pessoas querem que até uma fila de almoço seja organizada democraticamente (?!?!?) - "quem chegou primeiro" de repente é um critério muito autoritário - é porque a palavra chegou num ponto em que até se um político exigir que se ataque alguma infração à democracia, o discurso dele parece mais idiota simplesmente por ter usado a palavra, tão desgastada em pequenas besteiras e muita mentira.

Claro que o mais cansativo é que a palavra costuma ser usada de duas formas idiotas: para dizer outra coisa, que não necessariamente é democrática por excelência, ou para fundar a democracia dentro da democracia.

As duas coisas podem ser exemplificadas facilmente em qualquer escola.

Quando, por exemplo, um grupo de professores está insatisfeito com qualquer coisa, por menor que seja, ataca a direção ou o que for de autoritária, fechada, nazista ou qualquer outro desses termos que atualmente já perderam quase todo o sentido também. Quer-se uma decisão democrática a respeito do tema! Detalhe: direção, por exemplo, é um cargo decidido democraticamente (no Rio Grande do Sul e na maioria do Brasil), por comunidade e pessoal da escola. Trata-se de uma escolha democrática, mas o sistema da escola é justamente ter alguém eleito nesse cargo para que ele cumpra seu dever enquanto os outros profissionais cuidam do resto. Chama-se "representação", e é exatamente o que acontece no nosso sistema político democrático! Quando a presidente faz uma decisão: ela não precisa perguntar cada coisinha para o povo, ela foi eleita para tomar essas decisões. Os eleitores podem intervir, reclamar, mas nada disso indica que ela tomar decisões executivas seja um insulto à democracia.

Há uma coisa que as pessoas esquecem: a democracia pode ser, e costuma ser, representativa. Viver numa democracia não é puxar voto sempre que se quer pintar ou não um meio-fio! Quando se acha que se deve realmente discutir isso, e todos os cargos envolvidos devem parar para contar votos da população inteira em vez de tomar suas decisões (obviamente com transparência), os termos "escolhas democráticas" estão sendo usados para o segundo caso que referi: fundar o "democrático" dentro da democracia, porque se está confundindo "pessoa eleita democraticamente cumprir seu papel" com ditadura!

Já o primeiro caso, de se usar "democrático" para dizer outra coisa que não é democracia, acontece em quase todo discurso sobre escolas. Quer-se uma escola democrática! Pois bem, (1) o que isso quer dizer, e (2) isso é realmente o que se quer?

Uma "escola democrática" nunca é o que se quer dizer com a expressão, porque ela seria redundante por um lado, ou inadequada por outro. Como disse, os cargos são eleitos, em algumas escolas todos eles são eleitos. Estou obviamente considerando escolas públicas, únicas que precisam responder a essas agendas.

Mas, digamos que as pessoas quisessem o exagero disso, que realmente não só os cargos de função gratificada, mas até os professores fossem eleitos. Por quem? Pelo poder público? Já o foram, através de concurso. Pela comunidade? De que forma? Por que critérios? Comunidades geralmente analfabetas ou sem letramento são mesmo quem queremos que escolha professores com o dever de formar seus filhos exatamente nisso?

Não estou dizendo que eles não podem tomar decisões importantíssimas a respeito de si, nem que, se o analfabetismo fosse mesmo como diz o governo, as escolhas seriam melhores. Mas (1) o analfabetismo não pode ser ignorado nisso, e (2) segue o problema de que governo algum pode tomar decisões de base, como Educação, conforme o gosto de cada comunidade, distante de qualquer projeto ou planejamento dele.

Agora, saindo um pouco do absurdo completo, quando se fala em democracia na escola se quer participação, especialmente dos alunos. Pois bem, aceitando essa proposta, em si bem complicada, a democracia é mesmo o melhor modelo para isso? Queremos que todos os alunos tenham o mesmo peso de voto que funcionários, professores, diretores etc, do papel higiênico ao livro didático? Eles estão preparados para esse julgamento e essa responsabilidade? Eles podem decidir tudo sobre uma escola, em pé de igualdade com os adultos, sem quase conhecer nada fora de suas comunidades, além de umas páginas redundantes de facebook e as bandas da moda, e tendo apenas alguma noção de leitura e interpretação?

As escolas que conseguem manter máxima participação dos alunos são escolas pequenas, com MUITO pessoal, geralmente particulares, geralmente muito caras. Algumas públicas tentam imitar esses modelos, não sei com que sucesso, mas sei que se tratam de aproximações...

O que se quer com a escola democrática, de fato, é uma escola em que a comunidade participe e os alunos tomem responsabilidade a respeito de algumas coisas, especialmente para terem cuidado com a escola. Pois bem, é possível participar de algo sem mandar na estrutura, até sem voto direto para nada.

Quer-se mesmo é que os alunos tenham algum poder sobre o que acontece e reajam construtivamente a abusos. Ora, uma comunidade em que o poder só pode ser exercido se justificado a quem está sob tal poder é uma comunidade anarquista (da teoria anarquista, não do oba-oba). Isso significa que "democrático" é um termo tão errado para o que se exige da escola nesses casos que até "escola anarquista" seria termo mais correto. Espero que isso indique, mais que nada, as voltas esse pobre termo já deu!

Quando uma palavra é uma bandeira, e só uma bandeira, é simplesmente triste lê-la e ouvi-la para todos os lados. Ela já não comunica nada, a não ser mentira e distorção. Mas não é por serem falsas que as palavras morrem...

domingo, 4 de novembro de 2012

Internetês como analfabetismo

É verdade que o internetês tem sua graça, seu estilo, suas potencialidades, até poéticas - se quiserem. E é verdade que é possível escrever internetês e saber escrever conforme a Gramática Normativa ao mesmo tempo.

Também é verdade que as duas afirmações, como todas as defesas ideológicas do que é obviamente um problema, referem-se às exceções das exceções.

Praticamente não se usa o internetês para se fazer firulas que não se pudessem fazer com a Gramática - nada dessa poesia cotidiana e espontânea com que sempre se sonha; quase ninguém sabia escrever conforme a Gramática já quando ela só competia com uma Norma Culta, sobre a qual tinha extremo poder, quem precisa da Gramática agora, que existe um campo livre de todo e qualquer domínio dela?

O problema do internetês nem é, aliás, seus potenciais, o problema é do que ele é sintoma. Observe-se o que se escreve na internet, particularmente o que pessoas com menos de 20 (para ser mais extremo) escrevem, e compare-se isso a textos até o fim da Idade Média. O internetês é a escrita de uma cultura oral.

Nossas regras mais cotidianas, como pontuação, separação de palavras, uso de minúsculas e maiúsculas, vêm de problemas que as cópias de textos foram gerando conforme se perdia noção do contexto original (em muitos casos, tratava-se de uma defasagem de séculos). É realmente possível escrever quase sem regras, quando o texto é praticamente uma anotação para servir como apoio à fala, quando as duas pessoas que se comunicam compartilham de quase todas as referências em questão, quando todos sabem exatamente os mínimos detalhes do contexto relevante ao texto. Soma-se a isso o clichê e a frase-feita.

No momento em que o texto passa a ser útil por mais que um dia, ou seja, no momento em que a tecnologia da escrita passa a ter algum valor de acordo com todo o seu poder, esse texto de mera anotação moral passa a não satisfazer mais. E o internetês é só esse texto. Muito pouco dele pretende ser útil por mais que um segundo.

O único detalhe é que escrever assim é a única forma reconhecidamente necessária para uma multidão de gente. Assim, a famosa língua que brota suas regras das necessidades de comunicação em grupo, sem um poder autoritário por trás como é o caso da Gramática Normativa, não gera o estilo rico, delicado e bonito dos sonhos de um Marcos Bagno (em que ele inconscientemente só parece supor pessoas minimamente treinadas na língua culta como ele próprio), mas sim um texto tão pobre quanto possível, tão isolado quanto possível. As riquezas que as novas ferramentas permitem não entram em uso sem, como no caso da Gramática, o poder de algumas pessoas muito talentosas, tradicionalmente chamadas de poetas. O detalhe é que esses poetas não podem afetar o internetês da mesma forma, porque seus usos e estilos não podem ser ensinados nem passados adiante; isso dependeria de um sistema de regras e controle, como na tão temida e (blergh) adulta Gramática.

Dessa forma, só o que resta são pequenas firulas que só parecem grande coisa a uma leitura de quem não tem noção tanto das capacidades da língua quanto de reconhecer os trejeitos da fala em toda suposta novidade do internetês. E os motivos não são misteriosos: uma sociedade de cultura puramente oral é uma sociedade analfabeta; uma sociedade analfabeta só tem cultura oral.

terça-feira, 30 de outubro de 2012

Clarice se destaca

Estou novamente redescobrindo Clarice Lispector (não, não é redundância). Ela é dessas autoras canônicas (como Cruz e Sousa, Oswald de Andrade...) odiadas de forma semi-velada por uma massa grande de leitores "informados", que se tornam, por isso, difíceis de ler. Parece que tudo se atravanca no caminho, seus textos tendem a ser adiados ou cortados de cadeiras da Letras, grupos de estudo, análises e assim por diante...

É muito mais fácil, então, Clarice ser lida de forma um tanto mais cotidiana, por fãs ou interessados, até porque cai bem elogiá-la em jornal, quando faz aniversário e tal. Mas isso pouco me interessava porque eu estava envolvido com Letras, não podia fingir ser outro tipo de leitor, nem acho que deva. Além disso, minhas listas A, B e C de leitura estão lotadas de livros, e muitos deles nascem de obrigações. Autores mal-quistos, mesmo que canônicos, tendem a não ser obrigação, ainda que gostemos deles...

Pois bem, acabo de ler um conto que representa bem o valor da autora, no entanto. Trata-se de um dos primeiros, " A Fuga". O que me chamou a atenção em primeiro lugar é que já representa bem muitas das personagens por que ficaria famosa (ou odiada) depois: trata-se de uma mulher que perdeu o navio, literal e simbolicamente. E isso é um ato, ou a ausência de um. Já explico a ênfase no "ato":

Aí está a grande diferença, pra mim, entre Clarice e quase todas as autoras "femininas" que são jogadas no mesmo saco, particularmente as cronistas que são comparadas a ela. Clarice Lispector não escrevia sobre mulheres sentindo pena de si mesmas e aproveitando fugas simbólicas. Com essas personagens, a autora (a meu ver) escrevia sobre a falência dessas fugas simbólicas, sobre o fato de que elas não bastam, de que acreditar, esperar, manter um coração assim ou assado não são NADA! Isso na década de 1940! Tem gente (muitas mulheres, justamente) ainda hoje achando que às mulheres só cabe a fuga simbólica. Vida real é pra ser triste e desconsolada...

"A Fuga" é aquele típico conto bem escrito, com movimentos de narrativa que autores como Paulo Coelho confundem com erro gramatical e que não se centra no anti-clímax que virou clichê para esse tipo de literatura bem depois dela (em grande parte por causa dela), mas também não se centra nas viagens da personagem ao longo do conto. Trata-se de um conto inteiro, talvez deva dizer inteiriço, que não enche mursilha para destacar um sentimento de que a mulher é especial, de que cada uma pode fazer a diferença, ou qualquer coisa do tipo. Só o que cabe ao leitor, como sempre, é reagir ao que leu, é pensar a respeito, é tomar posição. A personagem não é um exemplo nem serve para acalentar os desejos procrastinadores ou as consciências mágicas que querem sofrer no seu lugarzinho e achar que isso as faz especiais. 

Se quer só sentir o coração cálido e pensar que é um floquinho de neve, Clarice não serve. Ela é literatura canônica porque é sobre a realidade, não sobre a mascarar, e os mascaramentos de suas personagens são o ridículo, o humano, a que se reage, tentando sempre sair daquelas amarras com que insistimos em nos prender, homens e mulheres, do século XX ou depois. Quem não vê isso, não precisa lê-la, quem achar alguns contos piores que outros, beleza! Agora, não me digam que ela é fraca, que não é. Ou, se querem dizer, provem! Duvido!

sábado, 20 de outubro de 2012

Formação continuada: a mesmice não morre

É difícil ser mais bitolado hoje do que se falando em modernidade líquida, velocidade e virtualidade disso ou daquilo. A menos que se esteja conversando com pessoas que nunca pensaram sobre a própria cultura (e não sejam nada instrospectivas ou intelectualistas), poucas afirmações podem ser mais óbvias do que essas. Pior ainda é se falar sobre a falta absoluta de verdades, tudo ser relativo, ou - o cúmulo - "hoje a gente vive na era da Internet"!

Não entendo como ainda se aceite que alguém, em 2012, esteja descobrindo a Internet. É tanto uma ferramenta quanto um fenômeno cultural batido. Não bastasse tudo isso, a maioria dos usos dela continua sendo uma recauchutada dos usos de ferramentas mais antigas, portanto grande parte do discurso sobre a Internet é meramente um elogio deslumbrado e ignorante.

Assim, ser convidado a me deslumbrar com a "cultura da nossa época" no sábado é simplesmente uma das piores notícias que eu poderia receber. É de doer ter que fingir que a "multiplicadade" e as incertezas contemporâneas são notícias, apaixonantes ou desesperadoras. Ainda se fosse alguém demonstrar quanta constância há nessa inconstância, quanta verdade há sob esse relativismo, não seria novidade, mas seria de se respirar um pouco. 

Mas não, seguimos sendo "continuamente formados" por pessoas que não reciclam o cerne do próprio discurso (ainda que usem exemplos novos) desde 1970 - e o formato dos comentários desde 1990. Os empregadores têm razão: ou atrelam o salário do profissional a fazer "formações continuadas", ou não tem quórum.

domingo, 7 de outubro de 2012

Bom domingo de eleição

Como nenhum político pode representar o interesse de todos os eleitores, cada um deles tenta representar o interesse pelo menos de certos grupos (ou nos convencer que o fazem, claro). Alguns grupos são representados por mais de um, outros por nenhum, mas o importante é que nenhum político realmente vai trabalhar pelos interesses de toda a população.

Nosso desafio, como eleitores, antes de ser o de julgar o que é melhor para a maioria, é tentar entender pelo menos quem vai nos favorecer, não desfavorecer. De uma forma ou de outra, nós também não podemos beneficiar a todos com o nosso voto.

Por essas e outras, quando vamos eleger alguém, votamos uns contra os outros. Isso quando não votamos contra todos.

Bom domingo de eleição.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Poema do mau cotidiano

Às vezes eu paro o que estou assistindo,
ou deixo muda a música que ouvia.

É uma propaganda política que passa
entrando estridente pela janela.

Ela deve ser honrada com o silêncio,
como uma má notícia.

domingo, 23 de setembro de 2012

Essa mudança linguística que eu não acompanho...

"Tu é playboy, tu mora em apartamento! Eu não, eu moro na rua, meu!"

Frase q acabo ouvir da rua, dita pra um passante. Que conceito revolucionário de playboy, hein?! Quem não mora na rua é imediatamente playboy agora?

quinta-feira, 20 de setembro de 2012

Propaganda eleitoral em Porto Alegre

As alturas dos candidatos indicam aproximadamente as intenções de voto para cada um, mas acho que Villaverde tá se espichando um pouco...

Fortunati não podia fazer diferente (será que não podia mesmo?), mas foi uma péssima escolha um slogan de "melhorou, vai melhorar"... Porto Alegre melhorou desde que ele virou prefeito? Não consigo pensar em nada que esteja melhor de 2010 pra cá. Ou talvez ele queira dizer que as coisas melhoraram desde que Fogaça, de quem era vice, ocupou a prefeitura? Bom, nesse caso, sua proposta é seguirmos mais 4 anos com as reticências do governo Fogaça? Baita candidatura essa...

Mesmo assim, desde que Fortunati virou vice, Porto Alegre não melhorou! Seria fácil argumentar que piorou, mas, mais do que isso, o grande problema me parece ser que uma coisa ou outra estar melhor (como um eleitor de Fortunati poderia querer argumentar) bate em teclas absurdamente pontuais. É esse o problema que só se agrava em Porto Alegre. O pessoal tem tratado o governo como um lugar pra fazer arremates, apagar incêndios e cumprir horário! Qualquer governante que preste só presta porque tem um projeto sistêmico, ou (o que acho um pouco pior, mas vá lá) uma bandeira um pouco mais restrita, mas fortíssima. Então, não é o caso se um viaduto não está mais desabando ou se começaram finalmente a planejar uma obra que foi proposta há 8 anos. Nem é o caso de se dizer que os alagamentos desses últimos dias indicariam uma terrível administração. O caso é PORTO ALEGRE (batendo no peito e tendo em imagem a cidade toda) mudou, ou não mudou? Não mudou. No pouco que mudou, o saldo é negativo. So sorry.

Manuela, conceito "comunista de shopping"
E a Manuela? Coitada, embretada numa estratégia de campanha tão capciosa quanto a da Dilma, tenta tirar suco de ser uma mulher jovem sem poder realmente admitir que está tirando suco de ser jovem ou mulher. Até porque a Dilma tinha o Lula pra lhe dar votos, inclusive pra falar por ela! A Manuela tá encalhada com aquele namorado (agora marido?), e é ele quem lucra votos por associação a ela, não o contrário. Ela tentou se associar à imagem da Dilma, mas foi vetada legalmente, e agora parece que liberaram de novo... Enfim, tática mais sem sal...

Pior ainda, muito senso comum político parece nascer de gente da nossa faixa etária, ou seja, de toda a galera que cursou faculdade na entrada do século XXI, como ela. Manuela tinha uma vida política bem típica na faculdade, mas nunca cuidou da imagem pessoal. Fofocas mil a seu respeito são corroboradas por exércitos de homens e mulheres entre os 27 e 30 e poucos anos. De alguma forma, me parece que suas indiscrições (associadas à atividade política, aliás), assim como as de seu atual "companheiro", têm pesado em sua rejeição de voto. Não sei como outros grupos a enxergam, no entanto.

E temos o Villaverde! Pobre coitado, é um nerd posto no ataque, na Educação Física. Sua forma contida, seu sorriso de quem não deveria estar ali, sua consciência de ser completo desconhecido de quem lhe descobre candidato a prefeito, seu jeito inclinado para a frente de andar fingindo ser decidido, sua campanha flutuando ao sabor do vento, sua forma de se encolher ainda mais perto do Lula, que mesmo contido aparenta o gigantismo de um Don Corleone pajeando o netinho indefeso... Pobre Villa! Vem, vem cavar segundo turno e apoiar a Manuela, teu destino...

domingo, 16 de setembro de 2012

Valorizando o mínimo

Tenho pensado em alguns paralelos sobre incompetência. Há um tempo criei um objetivo para algumas séries, mas ele sempre ressurge motivado por algumas turmas específicas. Ele poderia ser resumido como "Fez!" Ou seja, o fato de o aluno ter feito ou não o trabalho é avaliado como parte dos objetivos do trimestre. Isso não quer dizer que turmas inteiras não façam os trabalhos nunca, nem que uma série inteira seja assim - como disse, é sempre uma turma que motiva tal objetivo a ressurgir.

O que acontece é que certas turmas tendem a se formar reunindo grande parte dos alunos que têm as maiores dificuldades (sociais, psicológicas, biológicas e o que mais conseguirem listar). Eles não chegam em tais turmas sem antes perderem todo e qualquer interesse em escola, educação, respeito e coisas tais, é claro. Seu nível acadêmico, digamos, deixaria a desejar aos mais pessimistas. Assim, na busca de uma forma de separar certos sucessos de muitos abandonos, bem como de valorizar as tentativas, mesmo que sem sucesso inicial, vou lá eu dar uma nota por ter feito ou não (às vezes por ter feito inteiro ou não).

Não vamos nos enganar que um aluno desses abandonaria a importância da nota mesmo trabalhando um ano com um professor super-hiper-ultra progressista. Portanto isso é, sim, uma forma de pelo menos colocar um A no boletim de um aluno que teve todas as dificuldades, mas tentou pra valer, o que pelo menos indica para o sujeito que algum reconhecimento burocrático ele está tendo e que, caso continue, poderá ter outros.

Pois bem, acontece que minha avaliação de serviços, sejam públicos ou privados, também andam por aí. Se uma empresa só FEZ o que eu paguei para ela fazer, já tem A+ comigo. Mando parabéns na avaliação e recado comemorativo para os pais de quem presida a empresa, se possível.

Há algum tempo, na verdade, eu não ia tão longe. Se uma empresa quase fizesse o que eu pedi, tentava me dar por satisfeito. Mas, até conheci umas pessoas competentes recentemente, que cumpriram o contrato ou o combinado, pelo preço acertado, e fiquei maravilhado com tanta eficiência. Houve até duas exceções, em que o trabalho superou minhas expectativas! Mas algumas incompetências alheias me reafirmaram como aqueles casos eram exceções.

Algumas pessoas podem pensar que há um paralelo simples entre alunos que, na melhor das hipóteses, só fazem seus trabalhos e empresas que, na melhor das hipóteses, só fazem o mínimo do que lhes é pedido. Não sei, acho muito simplório. Quer dizer, nem sei há quanto tempo professores podem ter feito isso que ando fazendo agora (sei que muitos contemporâneos meus têm mecanismos parecidos). 

De qualquer forma, aí seria preciso considerar que tem aumentado a massa de alunos que não apenas quer nota por ter feito o trabalho, mesmo que mal, mas sim que exige nota máxima só por tentar fazer (e esses não são ex-alunos meus - ou seja, isso não é resultado do sistema de tentar valorizar quem cumpre o combinado, afinal, num sistema como o meu, a nota pela matéria avaliada no trabalho continua bem clara e honesta, logo ao lado no boletim). Ou seja, por esse paralelo, teríamos mais e mais trabalhadores que iam querer ser pagos na íntegra por tentar instalar a eletricidade da nossa casa, por tentar fornecer um sinal de celular, por tentar aplicar as regras de trânsito, por tentar julgar imparcialmente, por tentar fornecer uma comida saudável? Bom, nós já estamos lá, não?

domingo, 2 de setembro de 2012

É tudo mentira

Até por dificuldade para ser constante e plenamente cético, a gente tende a selecionar "verdades" políticas. Ou melhor, a gente pega o que ouve e encontra brechas para aceitar certas verdades, ou meias-verdades. A propaganda sobre o programa de governo tal (pensamos) pode ser mentira, mas parte daquilo foi feito; ou foi feito mesmo, só não por aquele partido; ou ainda aquilo é mesmo como estão dizendo, mas só surgiu por iniciativa da população ou de uma ONG, não de um partido.

Pois bem, resolvi fazer um serviço público e avisar ou reforçar para quem venha a ler este post: no caso da Educação, NADA do que é dito é verdadeiro. Não, candidato X não fez! Não, não foi aquele partido! Não, não estão lutando pelo que dizem! Não, não valorizam! Não, os alunos não recebem! Não, a situação não melhorou! Não, o caminho dos alunos não foi asfaltado! Não, a escola não foi construída! Não, a universidade não está funcionando! Não, o país não atingiu tal resultado positivo! Não, não e não.

Agora, se o eleitor quer fazer relativismos, descansar do ceticismo ou encontrar pequenas verdades no que um político está dizendo, que não o faça na Educação. Aí, a propaganda política, qualquer propaganda política, está mentindo, sim. Completamente. Profundamente. Descaradamente. É 100% mentira.

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Dúvidas ateias do cotidiano

Ainda acho estranho quando alguém, numa enorme cidade, dentro de um prédio com ar condicionado, caminhando sobre uma esteira elétrica, usando roupas especificamente planejadas para exercícios, diz que Deus sabia o que estava fazendo, portanto tudo dá certo (na saúde) se fazemos como Deus planejou.

Isso era um "argumento" para que as crianças mamassem até quando as mães tivessem leite (que eu saiba, se a mãe realmente não quiser parar, isso pode ir muuuuuuuuito mais longe do que essa moça talvez imagine). Mães que não conseguem dar de mamar talvez devessem deixar seus filhos sem leite? Sei lá, mas o "argumento" era também para que, então, a criança não só parasse de mamar, mas não tomasse leite algum, nem de vaca, cabra ou o que fosse. Talvez Deus não tenha planejado nosso domínio sobre os outros animais - apesar de o Gênesis dar indicação contrária, que eu lembre. 

Acho que não recebi as instruções que ela tem. Só sei que, seguindo a natureza como mandamento divino, não estaríamos nunca em roupas planejadas para exercícios, sobre esteiras elétricas, dentro de prédios com ar condicionado, em uma grande cidade...

domingo, 26 de agosto de 2012

As inversões de valores invertidos

Uma daquelas expressões que chamam a minha atenção, para discordar, é "inversão de valores". Quando se diz que pessoas vivem conforme, experimentam, sofrem (ou sei lá o quê) uma inversão de valores, pressupõe-se uma de duas opções, as duas falsas.

A primeira, menos preocupante e menos representativa, creio, é a ideia de que certos valores existem por si e são constantes, que valores não mudam, nascem ou se transformam historicamente. Ou seja, existem determinados valores fixos e a única possibilidade é se acreditar neles ou em seus opostos, em anti-valores, que são corruptelas daqueles. Não existem valores diferentes, anteriores ou posteriores. 

Como disse, não acho que essa versão seja representativa pois poucas pessoas concordariam com isso posto de forma assim radical. Além disso, ao falar em "inversão de valores", as pessoas não querem ser tão filosóficas assim, ainda que a expressão seja bem pretensiosa. De qualquer forma, acho importante comentar o quanto essa ideia não faz sentido, mesmo sem apelar a pós-modernismo, pós-crítica ou qualquer outra forma filosófica de relativismo em hyperdrive.

Consideremos a ideia de que matar é errado. É preciso sempre definir, "matar quem?" É preciso defini-lo pois se sabe que matar só é errado, em cada cultura, quando se define o objeto do verbo. 

Supondo uma postura moral de facebook, muita gente acha hoje em dia que matar qualquer pessoa é errado. Bom, não é segredo que já foi bem ok matar negros, índios, gays, nazistas, comunistas, sei lá.
Sim, até aí estamos no "ok", mas já houve tempo (seguindo ainda só o tronco da cultura de quem acha que é errado matar qualquer um hoje) em que matar o estrangeiro, o cara da outra religião ou o cara da outra tribo não era só permissível, ou um crime menor. Era certo, reforçado, apoiado e, em alguns casos (como na racionalização teológica das Cruzadas), uma forma sagrada de se salvar a própria alma. Em muitas tribos, matar era parte importante da estrutura social, mesmo que não se estivesse em "guerra" - especialmente por rito de passagem ou de matrimônio. Talvez fosse melhor dizer que tais tribos viveram sempre em guerra, e o "viver em paz" é invenção um tanto civilizada (Saindo um pouco do problema do tempo, infelizmente sabemos que todas essas posturas ainda são possíveis hoje.)

Se quiserem pensar de outra forma: houve um tempo antes da Declaração dos Direitos do Homem, um tempo antes do ágape, um tempo antes do "Não matarás (hebreu fiel)". Todos os valores que conhecemos são históricos, portanto nenhum pode se vangloriar de ser eterno ou onipresente (o que é diferente de dizer que alguns não mereçam ser universalizados).

Então, não existem uns poucos valores reais e estanques, os quais vivem ou subvertem e deu. Existem valores, com um plural reforçado, e aquilo que discorda do nosso valor pode ser, sim, um valor também. A questão é que a validade do valor é relativa. ATENÇÃO: isso não quer dizer que qualquer opinião é válida, que qualquer princípio é um valor, nem que todos os valores são adequados para qualquer sociedade. Quer dizer só o que eu disse: sociedades diferentes podem discordar sobre que valores são válidos, verdadeiros ou melhores.

A segunda forma, mais comum, de se pensar a "inversão de valores" é supor que os valores em questão são os "nossos". É claro que os valores mudaram na história, mas o que interessa é o que reconhecemos como valores hoje (ignorando culturas distantes). Bom, para quem não notou, nossa sociedade não tem um bloco de valores comuns. Talvez existam outros recortes possíveis, mas eu posso atestar que separações econômicas, particularmente as que "coincidem" com separações geográficas, fomentam valores diferentes. 

É errado (porque falho) pensar que uma pessoa que vive na mesma cidade que outra herda o mesmo tronco de valores comuns. Os valores que estamos acostumados a ver como universais não têm necessariamente precedência na vida de todo o mundo, nem estão na infância de jovens que crescem e "os invertem". Esses jovens simplesmente aprenderam valores diferentes, para uma vida diferente, a partir de histórias e mitos diferentes, a fim de sobreviver da forma que seus pais ou amigos estão sobrevivendo.

Nada disso significa, também, que valores não possam coincidir entre culturas, portanto entre comunidades diferentes de uma mesma cidade. Também não significa que meios de comunicação de massa não tenham oferecido pelo menos algum contato que possibilite diálogo entre as diferentes comunidades, num movimento constante. 

No entanto, é preciso atentar para o fato de que valores diversos também podem se vestir de forma parecida. Algo parecido com uma foto da Gisele Bündchen ser vista como motivo para consumo por razões diferentes, entre mulheres de classes muito distantes. O mesmo é verdade em relação à ideia de que a família é importante, ou à de que homens devem defender suas namoradas e esposas. Cada cultura pode construir um ethos diferente partindo do mesmo clichê cultural.

Talvez possa haver inversão de valores quando falamos de uma geração para a seguinte, mas o resultado são também valores, ainda que novos. Não adianta muito pensar nos queridinhos valores nossos, que achamos serem corrompidos ou traídos por sei lá quem. Importa ver que, se estão sendo afrontados, sofrem o cerco de outros valores que têm também fortes motivos para existir, assim como os nossos.

Portanto, não adianta pressupor uma vantagem para nossa posição moral. O que importa é entender os motivos da existência dos valores que estão nos incomodando. Talvez isso nos indique que estivemos equivocados e que nossos valores na verdade não prestam tanto quanto achamos. Por outro lado, talvez nossos valores sejam corroborados pela experiência, talvez se comprovem inafiançáveis. Nesse caso, é melhor ainda entender por que outras pessoas pensam diferente de nós, caso queiramos resolver a situação, fazendo com que pensem como nós e aceitem nossa forma de entender o "certo" e o "errado".

sábado, 18 de agosto de 2012

Olímpicos, orai por nós

Brasileiros por acaso: melhor equipe de vôlei feminino do mundo.
Nunca tinha dado bola para as Olimpíadas no século XXI. Até 2000, acompanhei, mas elas pareciam ter perdido o sentido desde então, o que já vinha acontecendo, é verdade. Dei uma olhada nas tecnologias da China, que era a terrível superpotência emergente que iria destruir o mundo ocidental pelo mercado, conforme os analistas de então, mas o fiz mais acompanhando fotos da cerimônia de abertura que realmente assisindo à transmissão. E deu.

Brasileiro por acaso: 3o maior judoca do mundo.
Estranhamente, quando as deste ano começaram, senti vontade de acompanhar tudo o que pudesse. Passei então a ver sempre que podia, na Record ou nas TVs por assinatura alheias.

Não foi difícil entender de onde meu interesse repentino nos jogos, depois desses anos todos. Já faz uns 4 ou 5 anos que eu vivo praticamente de dar aula, mais do que qualquer outra coisa. Não vinha mais praticando esporte e todo o meu esforço de pesquisar ou escrever virou um rodapé sem remuneração. Não que eu recebesse para estudar antes, mas as exigências de sala de aula são muito maiores do que as de qualquer ganha-pão que eu tivesse antes, de modo que o que eu faço de graça perdeu muito terreno.

E o que significa dar aula? Significa mirar quase sempre no médio, no mais ou menos, no aceitável. Não estou falando sobre políticas inclusivas, cotas ou qualquer outra bandeira. Para um aluno deficiente, por exemplo, atingir a média pode ser um gigantesco desafio. Acontece que o aluno típico também pode e só precisa render muito abaixo de seu potencial. Não importa muito a opinião do professor a respeito; ele é requisitado a fazê-lo por quem o contrata, pelo menos quando é professor público. Existem exceções a isso, mas só ocorrem por mérito de algumas diretoras, localizadas em contextos que as permitam manter uma escola atípica.

Brasileira por acaso: maior judoca do mundo.
Dar aula é ser exigido ao máximo para exigir o mínimo. Podem frasear de forma diferente se quiserem, duvido que achem um argumento para que não seja só eufemismo para isso.
As Olimpíadas só podiam então atrair minha atenção: uma cultura de exigência máxima, de dedicação extrema, de superação, de desejo de perfeição, além de uma forma absolutamente elegante e honrada de lidar com a competição, uma capacidade de pensar o "vale a pena é competir" e de aceitar os acidentes do caminho que só quem se dedica ao máximo a algo consegue compreender e executar. Entender a derrota, não humilhar nem a si nem ao próximo, é muito mais fácil para quem tenta com toda a dedicação, não para quem se satisfaz sempre com pouco.

Logo, tanta gente (inclusive grande parte de nossos jornalistas e opinadores) que vive da cultura do "até aqui tá bom", "ah, deixa assim que ninguém ia fazer mais mesmo" etc., toda essa gente cai no pau por qualquer medalha de prata e adora exigir resultados dessas pessoas que dão um duro inimaginável. Aliás, sempre que se fala em equipe "brasileira", já está se fazendo um abuso exatamente nesse sentido. O que o Brasil faz para supor que é representado por essas pessoas apaixonadas e esforçadas? Não digo só o governo. Todo brasileiro é quem para se orgulhar em nome do Zanetti, que ganhou ouro nas argolas, a custa de fazer os próprios aparelhos e treinar como era impossível no Brasil até ele próprio criar o jeito? Em que universo bizarro o Brasil se veria espelhado num sujeito desses, como nação? 

Brasileiro por acaso: 2o maior boxeador do mundo.
É óbvio que o governo comete a mesma pressuposição ridícula. A Dilma foi lá tirar foto com os medalhistas. Ora, quem lhe deu estatura de julgar que apenas os medalhistas mereceriam foto com a presidente? Por que os outros não estavam lá também, que chegaram às Olimpíadas apesar de todos os nossos presidentes, incluindo a própria Dilma? E o que eles teriam a agradecer ao governo, tirando, talvez, exceções como o futebol (que de fato se explica por outras vias para se destacar)?

Brasileiros por acaso: 5o maior equipe de basquete do mundo.
As Olimpíadas são o oposto da cultura brasileira. Em nada a nação explica sua equipe trazer qualquer medalha, ou mesmo competir. No entanto, todos querem legislar sobre os competidores, julgando comportamentos, falas, decisões, esforços, inclusive comemorações. 

Foi o que fez André Barcinski, um "crítico da Folha" e produtor de TV, que acusou a não mais poder a equipe brasileira do vôlei feminino por ter rezado ao ganhar. Pressupunha ele, como deixou claro no texto, que a equipe representava o Brasil, o que já é muito problemático pelos motivos que acabo de expôr. Partindo disso, declara que foi um ato de intolerância religiosa rezar. Por quê? Porque estavam representando (sic) um país laico que, ao mesmo tempo (supõe ele), não aceitaria manifestações de nenhuma outra crença que não a cristã. 

Brasileiras por acaso: semifinalistas mundiais do nado sincronizado.
Três problemas graves: acha que alguém, nem que seja a nação supostamente levada às quadras, pode legislar sobre a comemoração do time quando as atletas manifestam as suas crenças religosas de forma pacífica (aliás, ele imagina que algumas o tenham feito por pressão, para não ficar deslocadas, baseado em... nada); acredita ainda que liberdade religosa é proibir a manifestação de crenças em todos os aspectos públicos da vida de todo cidadão; considera lógico, por fim, que nenhuma manifestação cristã pode ser permitida porque as outras também não seriam - ou seja, se não se aceita umbanda ou budismo, a solução é proibir o cristão e não permitir aqueles!

Por esse raciocínio, André é "libertário" proibindo um time que é posto abaixo de sua crítica apesar de tudo só porque ele é brasileiro e elas fizeram a bobagem de usar o próprio talento e esforço para representar um país que não as aceita nem apoia, e o time de vôlei todo é considerado "intolerante" porque agradeceu ao seu deus, baseado na crença de que ele teria algum mérito decisivo pela vitória. Eu não acredito em deus algum, mas devo dizer que a crença nele com certeza fez mais parte daquela vitória do que qualquer ato dos Andrés que povoam o Brasil. Se o time vai homenagear alguém, todos os Andrés só fariam bem ficando bem quietinhos nos seus cantos, com muito respeito. Eles têm a liberdade de falar besteiras, é verdade, mas continua sendo uma pena que ninguém com projeção também declarem suas besteiras aquilo que são.

sábado, 11 de agosto de 2012

Lugar para viver bem

O ponto de interrogação foi a melhor ideia!

Faz 2 anos que convivo mais diretamente com a análise de apartamentos, por milhares de motivos. (De um jeito ou de outro, todo o mundo quer se mudar?) A dificuldade de encontrar um espaço não só decente para se viver, mas bem distribuído, entra em choque com apartamentos ficcionais, especialmente com aqueles a que nos apegamos. Neles, mesmo que descontemos os planejamentos para o movimento da câmera, ainda encaramos um lugar agradável, pensado para pessoas, não apenas para respeitar ou distorcer a metragem. 

Em geral, a ficção não serve de parâmetro para o que acontece ou para o que é exigido de um profissional real. Professores, bombeiros, policias, jornalistas, políticos, arquitetos, piratas... poucos poderiam ser exemplos para ou da vida real.

Isso não quer dizer que alguns deles não possam se tornar ideais para os profissionais de fato, como de fato acontece. Até Indiana Jones foi e é herói de muitos historiadores. E quanto aos arquitetos implícitos? Será que os espaços de seriados e filmes não podiam servir de exemplo, pelo menos um pouco?!

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Teoria da Conspiração das Cotas

Aprovada na quarta-feira, no Senado, uma nova lei prevê que 50% das vagas de todas as universidades públicas serão dedicadas a "cotas sociais" (quem estudou todo o Ensino Médio em colégio público). Estas, por sua vez, devem ser preenchidas por negros, pardos(?!) e indígenas, no mínimo, conforme a proporção dessas populações em cada estado. Há ainda uma divisão dessas vagas segundo a renda da família  (calculada e verificada por sabe-se lá quem).

Dizem que a cereja desse bolinho - eles nem fariam vestibular ou Enem, sendo selecionados conforme a média de suas notas no Ensino Médio, ou seja, conforme a hipocrisia do governo de cada estado ou município - deve ser o único ponto cortado, para que a lei passe "mais facilmente" no fim do trâmite.

Ao mesmo tempo, o governo caga para a greve das federais e não enfrenta (nenhum governo o faz) o problema da educação de base de verdade (tomando apenas medidas mais ou menos efetivas, ou seja, no fim das contas, ineficazes).

Pois bem, isso é pra "qualquer um" de escola pública. Mas o que o governo planeja para quem se esforça pra valer? Pra quem consegue ler muito, estudar, se sacrificar até? Seu plano para esses estudantes parece ser também resolvido com cotas: ele paga para que cursem as faculdades particulares. Tanto estes quanto os alunos de escolas particulares (especialmente os mais estudiosos, é verdade) têm cada vez mais incentivo para ir para fora, procurar bolsas nos EUA ou na Europa, enfim, deixar o Brasil e ir aprender com os best of the best.

O que me lembra: população pobre ou menos estudiosa presa num Brasil analfabeto funcional e alunos dedicados ou com mais dinheiro estudando fora não é um quadro histórico no país? Dilma não é o fim de um processo para deixar o Brasil com cara nova, mas do jeitinho que sempre foi?

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Instinto materno e violência

"E eis que surgiu o primeiro Tigre Retórico!"
Por séculos, fazem-nos crer, o instinto materno foi das coisas mais inquestionáveis da nossa cultura (no mínimo desde a primeira Revolução Industrial). Estava lá no topo da lista com a criação divina do universo e a existência de almas imortais em todo ser humano (restrito que fosse esse conceito em diferentes momentos históricos).

O feminismo ficou famoso por, entre outras coisas, questionar a factualidade desse instinto. Havia marcas óbvias de um constructo social particularmente útil, então, à odiada ordem patriarcal, e a ala mais radical do movimento negou completamente a existência de tal instinto para além de uma mera criação humana. Tornou-se de bom tom, em certos círculos, pressupor o absurdo do termo "instinto materno" sem discussão alguma, e mais uma divisão ideológica ficou bem firme para nossas bandeiras de senso comum.

Mas aí a ciência, reclamada como argumento contra tal instinto (a própria definição de "instinto" levou muitas porradas no século XX, se não desde o XIX), seguiu fazendo suas pesquisas e muitas coisas indicaram a validade de um instinto de proteção a favor do filho, particularmente no caso da mãe. Por exemplo: é óbvio que uma espécie em que os pais contribuem para o desenvolvimento do filhote (quando, como na nossa, o recém-nascido depende particularmente disso) tem vantagens de sobrevivência sobre concorrentes que não o façam - e é possível apoiar isso com certas observações e indicar o mesmo por certos cálculos. Além disso, a gestação cobra das mães de forma desigual em relação aos pais, que não são organicamente necessários para o bom desenvolvimento do feto. Se o macho vai embora, a criança se desenvolve. Se a fêmea expulsa o feto de seu útero, não se pode dizer o mesmo. Portanto o custo para a mãe é maior de início (sua alimentação está diretamente afetada por no mínimo alguns meses), o que tende a favorecer o desenvolvimento de muitas tendências comportamentais que batiam, em conjunto, com a tradicional ideia de instinto materno.

Ora, a ciência segue pesquisando, mas muitos problemas patriarcais herdados seguem existindo também. Nessas horas, como quando ela nega criacionismo ou astrologia, muita gente tende a lembrar dos erros da ciência para tentar se defender de uma possibilidade que lhe seja desagradável. Para além de defender a "verdade" e os ideais religiosos ou tradicionais, uns simplesmente não querem admitir que o instinto materno possa não existir enquanto outros não querem supor o contrário (lá por suas questões particulares e geralmente identitárias).

Bom, poucas coisas convencem mais a gente a duvidar de instintos maternos que ver zilhões de casos em que mulheres, livres da influência direta de drogas, abandonam seus filhos, maltratam-nos, permitem conscientemente abusos sexuais (ou realizam-nos) ou usam seus filhos unicamente como fonte de renda (seja por trabalho ou por Bolsa Família). Ou seja, nada como trabalhar em escola pública para duvidar de qualquer instinto universal feminino para defender a prole. Ao mesmo tempo, vi também muitas vezes amigas tendo filhos e nitidamente tudo mudando em seu comportamento e constituição. Essas mudanças pareceram graduais durante a gestação, mas havia algo particular a partir do parto. Muitas outras pessoas atestam o mesmo. Seria mesmo a realização de uma cultura que tão monoliticamente se apresentava em pessoas tão diferentes, criadas e experimentadas também de forma muito diversa? Como isso poderia se chocar com os outros casos que testemunho? Resolvi elocubrar com liberdade a respeito, como me cabe neste blog. 

Detalhes prévios importantes: é diferente dizer "instinto materno" de dizer "obrigatoriedade de ter filhos". Aliás, as duas ideias são mais diversas que conectadas. Também devo dizer que estou imaginando, em quase todo o texto, as situações de maior violência entre mãe e filho. Se algum termo meu parecer pesado, já sabem...

Quero começar indicando um contraponto em vista dos mesmos casos de violência. Não parece fácil afirmar que essas mães ignorem a diferença entre seus filhos e as outras crianças. 

Dirão então que essa diferença não depende de instintos, sendo talvez puramente cultural. O problema de se dizer isso, no entanto, é que implica uma contradição, a meu ver: elas tratam mal seus filhos, que são culturalmente sua responsabilidade e objeto de amor perfeito, mas, ao mesmo tempo, os diferenciam por efeito dessa mesma cultura? Mais: elas nem mesmo parecem ter aprendido que devam favorecer alguém. Elas não "substituíram" seus filhos, não dedicam carinho e amor a outra pessoa, pequena ou grande. Seus sentimentos "amorosos"-sexuais estão presentes, mas não inspiram palavras como "afeto" ou "carinho", ao menos em suas manifestações públicas. Pelo contrário, estão em relacionamentos dos mais destrutivos, para si e para os outros. Há certo aspecto de sobrevivência neles, mas justamente do tipo que provoca aquele antagonismo entre "sobreviver" e "viver". Nesse sentido, para quem diferencia "carinho" de "vontade de proteger", que é o sentido mais estrito de instinto materno, é verdade que essa vontade de proteger se manifesta em outras relações, mas me parece ser mais de competição. Uma mulher dessas defende "seu homem", por exemplo, com unhas e dentes, mas não é pelo bem do cara, é para a relação de mutualismo não se desfazer.

Mais do que isso, muitas expressam sentimento de culpa ou a justificativa de que a criança fica melhor sem elas (ainda que nada pudesse comprovar que estão se sacrificando como nos casos em que acreditamos - mesmo sem creditar valor ao argumento - que a pessoa realmente sinta o que está dizendo). Ao que parece, elas diferenciam seus filhos justamente pela violência, ou seja, se creem com maior direito de usar crianças que são "suas" do que crianças que sejam "dos outros". Quero dizer, elas parecem acreditar que quem nasce delas tem uma particularidade, mas a seleção se dá totalmente no campo da violência, não do amor, o que postula uma possibilidade um tanto terrível para reforçar a ideia de instinto materno.

Para pensar isso, é preciso considerar duas coisas sobre a possibilidade científica da teoria. Primeiro, o que é "instintivo" é percentual. Ou seja, a pessoa tende a determinada coisa, e é isso que significa dizer que ela "tem os genes" para aquilo. Segundo, essa tendência exige uma formação cultural. Nada geneticamente "determinado" se manifesta sem um caráter social, uma cultura que justamente formate e desenvolva (as duas coisas são indissociáveis) aquilo que o corpo individual tende a querer.

Por tudo isso, é possível pensar o seguinte: não é que mães que maltratem seus filhos não tenham uma seleção instinta em relação a eles, que os distinga do resto das crianças, mas que a cultura e a vida em que essa pessoa está imersa (talvez desde criança, talvez por um trauma muito forte) são tão violentas que sua seleção por aquela criança seja também de violência. Ou, posto de outra forma, somente assim, talvez, aquela mãe saiba ver uma figura afetiva. Visto assim, o meio ainda reforça a teoria do instinto materno por outra via: muitas mulheres adotam crianças alheias. Ou seja, mesmo vivendo em ambiente semelhante, parece que uma constituição um pouco diferente, a oferta de outros exemplos ou a sorte de não ter passado por uma destruição mais direta mantém uma vontade férrea e extremamente custosa para si de proteger crianças que são, então, criadas como filhos. Uma simples capacidade de transferência e empatia é veículo daquele mesmo amor materno que tanto se curte louvar diariamente em pequenas conversas de bar, sala, esquina, caixa...

Não sei nem poderia dizer que essa hipótese é verdadeira, ou quantos porcento essa ideia abarcaria, mas imaginem, se houver algum fundamento nessa linha de raciocínio, a gigantesca violência da cultura em que tal pessoa deveria viver. Imaginem também o desconforto social de se parar de isolar indivíduos com frases como "Como uma mãe pode tratar um filho assim?" ou "Eu não entendo uma coisa dessas. Que horror!". Suponham que tal quadro não fosse explicado por desvios "impensáveis" de uma ou outra, mas fosse visto sob a ótica de que elas vivem em comunidades de tamanha violência que um instinto de proteção natural estivsse assim distorcido, sem a necessidade de drogas, doenças mentais ou outras questões muito individuais (que obviamente são relevantes em certo casos) para explicar o quadro. Comunidades essas que existem entretecidas formando nossa sociedade, fazendo trocas constantes entre si, a ponto de não conseguirmos diferenciá-las muito bem, nem por claras separações econômicas e coisas tais. Que responsabilidade social implica a validade do instinto materno?

terça-feira, 17 de julho de 2012

Diversidade e ignorância sobre greves federais

Em reação a isso.

Que ignorância achar que "greve remunerada" é um conceito estapafúrdio, quando é a base mesma do direito de greve. Que ignorância achar que isso sustenta qualquer pessoa que "não queira trabalhar", que poderia automaticamente entrar em greve e receber seu salário. Que ignorância achar que a remuneração do grevista é automática, sem critério algum. Que ignorância não saber que o salário, se sustenta o trabalhador em greve, será integralmente descontado se o mesmo trabalhador não pagar por cada dia de greve depois, situação única da profissão de professor, (justamente esses "vagabundos" trabalham por todos os dias em que ganham salário, diferente de qualquer outra classe que possa fazer greve)! 

Que ignorância achar que a maioria dos professores (pior: que todos!) em greve estão na classe A!!!!! 

Que ignorância achar que os professores querem automática e necessariamente mais impostos, ou que isso é a única forma de se resolver os problemas dos institutos federais. Que ignorância achar que os professores querem unicamente melhores salários, ou mesmo que isso resuma a maior parte de suas reinvidações (que tal começar pelos prédios de aula literalmente desmoronando?). Que ignorância acreditar que os professores em greve não trazem outras formas de contribuição para suas faculdades ou institutos quando não estão em greve. Aliás, que ignorância não saber que vários deles seguem contribuindo para o investimento nos institutos e faculdades federais, bem como diretamente a seus alunos, durante a greve. Que ignorância crer numa dicotomia professor/funcionário público, assumindo ainda que a única forma de ser funcionário público é aquele senso comum de se atirar nas cordas e que a única forma de ser professor é o clássico mártir ético, que resolve de mãos nuas as incompetências de toda a estrutura que deveria lhe sustentar e que, contraditoriamente, só segue em pé por seus singulares esforços. Que ignorância achar adequado, benéfico ou aceitável reincidir nesses preconceitos e reforçá-los sem, pelo visto, o menor conhecimento de causa, sem nada saber sobre professores, aparentemente, para além dos lugares comuns de debates de esquina.

Quanta ignorância vinda de um sociológo, que andou estudando que sociedade para resumir dessa forma o quadro atual e aceitar tais clichês do senso comum como conceitos para um texto de jornal?

Quanta ignorância selada pelas únicas palavras sábias escritas na página: "Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo."

É preciso muita diversidade para caber tanta ignorância.

sábado, 14 de julho de 2012

Um cidadão a menos; menos que nada

Na semana passada eu passei por uma das experiências mais simbólicas da minha vida, de um tipo que confirmou minha visão de mundo de forma curiosa e particular. Devo dizer que odeio quando isso acontece, quando descubro que estou certo. Sei que tendemos a gostar de quando confirmamos nossas opiniões pelos fatos, a posteriori. Sentimos que somos muito espertos, em geral. Isso é verdade para mim também, em muitas áreas, mas particularmente ruim quando é minha filosofia de vida que se confirma.

Nesse caso, eu pago o preço de ser tão pessimista. Devido ao meu pessimismo, minha visão de mundo se confirmar significa, necessariamente, que algo ruim é comprovado.

No caso, eu fui a um posto de saúde pedir a vacina contra gripe H1N1. Tinha evitado ir por tanto tempo porque eu tenho apenas uma característica de risco (doença respiratória crônica) e nenhuma pessoa em meus círculos estava nem com suspeita da gripe. Sei que o status quo é pular em qualquer oportunidade de se identificar com o proverbial Outro, mas às vezes devemos nos identificar com o menos proverbial Mesmo. Por isso, em vez de aproveitar a oportunidade de me reconhecer como de um grupo de risco, resolvi deixar a vacina para crianças, idosos, grávidas etc., simplesmente seguindo com minha vida.

No entanto, na semana passada um aluno da minha escola foi diagnosticado com a doença. Achei que era hora de parar de brincar com a coisa e ir lá me prevenir, além de me defender de espalhar o vírus, caso o estivesse já carregando de qualquer forma, assim potencialmente espalhando para entes queridos e alunos. Como as mortes pela gripe têm aumentado, achei óbvio que a campanha ainda seguiria, pelo menos, por um tempo durante o inverno.

Eis que chego ao posto de saúde e pergunto onde poderia tomar a vacina, nem entrando no mérito ainda se seria aceito para a inoculação ou não. A resposta do senhor do balcão de informações: "Não temos mais, só no ano que vem".

Achei que tinha ouvido mal e perguntei de novo: "Ano que vem?" Resposta: "Sim, o governo já cumpriu a meta".

Essa frase me soou poderosíssima. Não ouvi apenas essa resposta, mas muitas outras ao mesmo tempo, como "o governo está satisfeito com as mortes evitadas e não se preocupa com as 'poucas' recentes e por vir"; "o governo está tranquilo com quem salvou e agora vai mostrar o número de mortos com orgulho de quem impediu catástrofe realmente significativa"; e assim por diante.

Ao me dar essa resposta, o sujeito me apontou a carta da prefeitura falando a respeito. Li nela, por cima, os números orgulhosos de quantas pessoas foram vacinadas, sem entrar em nenhum mérito comparativo com outros anos ou com o número de mortos. A carta em nada melhorou o efeito daquela resposta para mim. 

Além de professores não serem considerados grupo de risco, o que já me soava bizarro já que lidam diária e intimamente com diversos grupos de risco, parecia que o governo queria confirmar que não se importava em nada com pessoas como eu. Em sua tática de combate à gripe, eu sou desimportante. 

Minha vida não é estratégica para ele. Eu já suspeitava.

terça-feira, 10 de julho de 2012

A sagrada mão privada para limpar a merda pública

Leiam isto antes.

Agora me respondam: que merda é essa?!

Isso é que é comprar discurso do governo! A única opção para resolver a Educação é aumentar impostos ou tirar dinheiro de outras áreas da própria Educação ou da Saúde?! Quer dizer que o governo, em todo o resto, está gastando muito bem? E, óbvio, é culpa dos professores que o governo não fiscalize os gastos dos reitores?

Claro, acabar com  o ensino público é a melhor solução! Afinal, as faculdades privadas são direcionadas por determinações ideológicas voltadas ao povo (por pior que isso possa ser executada na pública, pelo menos está em disputa franca sempre) e escutam exigências públicas, elas sim cumprem todos os deveres legais mesmo que não sejam fiscalizadas. Suas bibliotecas são abertas para todos e seus seguranças nunca impediriam certo "tipo de gente" de entrar em suas dependências.

Mas estou me perdendo em bobagens. O problema não é o que uma faculdade privada faz, mas sim que a resposta para o problema de qualquer instituição pública seja sempre acabar com esse seu caráter. Ou seja, qualquer problema não deve ser resolvido pelo governo, mas descartado ou jogado nas mãos da iniciativa privada. Por que a resposta para a irresponsabilidade do governo é sempre tirar mais responsabilidades dele?! 

Pior ainda, como sempre, SE fosse possível o governo acabar com o ensino público superior, ele ainda arrumaria a faculdade para entregá-la funcionando à mão privada (milagrosamente achando soluções para o que "não podia ser resolvido" antes) e os impostos (DÃ!) não abaixariam!

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Um aumento para todos!

A maioria dos professores não gosta de alguns aspectos da profissão e odeia profundamente pelo menos um deles (podemos incluir, é claro, colegas como "aspectos da profissão"). Para fugir de seu mal, seja lá o que for, os escapismos escolhidos pelos professores são vários, mas quase sempre envolvem consumo. O stress da pedagogia é resolvido por meio de, especialmente, esmalte, botas, álcool, livros, filmes, viagens, cães ou gatos e os produtos para alimentar e mimar estes últimos. Devemos acrescentar a tudo isso seus gastos com saúde, desde vacinação e remédios para as constantes pequenas doenças até, claro, a terapia psicológica ou psiquiátrica. 

Como existem precisamente zilhões de professores no Brasil, e como o stress de dar aulas, pelo visto, só aumenta, os sofrimentos dos profissionais da educação representam um consumo poderosíssimo. Esmaltes e livros podem, em geral, ser conseguidos por bons preços, mas mais cedo ou mais tarde o gasto com álcool, viagens ou animais de estimação tende ao exagero.

Tudo isso indica, portanto, que uma poderosa maneira de aquecer o terceiro setor é aumentar o salário dos professores. Menciono aqui apenas para registrar a ideia...

domingo, 8 de julho de 2012

Interpreta pra mim?

Tem sido ainda uma experiência curiosa ver jovens (nesse caso, pessoas com menos de 17 anos) assistindo a filmes. Em primeiro lugar, vê-se que estão bem acostumados aos preceitos dos produtores e, noutra direção, que estes têm razão: a ação é a única coisa que concentra. A agitação e o barulho é o fundamental. As falas não ganham grande respeito ou interesse, o que faz pensar que Wall-e ter feito sucesso não indica que, como antigamente, ainda é possível prender sem o apelo a diálogos, mas sim que o que os personagens têm a dizer recebe tão pouca atenção nos filmes em geral que se pode mesmo tirar todo tipo de expressão verbal do filme. Isso é, aparentemente, o supérfluo. 

Por outro lado, as expressões faciais lhes dizem muito! Disney, Pixar e Dreamworks têm mesmo razão em apostar tanto nos olhares e na linguagem corporal extremamente didática de seus personagens. O entendimento com meias-palavras é bem mais expressivo que o diálogo - talvez combinando com o que eu disse no parágrafo anterior, pois ainda são, em certo sentido, ação, movimento.

Mesmo assim, olhares e gestos podem ser interpretados de formas muito diferentes e, como palavras e grandes partes do filmes são ignoradas em prol de celulares, comentários, lembranças ou coisas do tipo, muito do essencial do filme é perdido. Além disso, o detalhe pode se destacar por uma bobagem qualquer (como criticar a cor do vestido da fulana, ou o fato de que o personagem NÃO resolveu algo com porrada), mas isso não é interpretado com coerência em relação ao conjunto. Não há atenção suficiente para se pegar esse conjunto, por isso os pedidos para que a pessoa do lado (colega, amigo, parente, professor...), qualquer pessoa do lado, explique o que está acontecendo realmente (além do que vai acontecer, claro) são incessantes. 

Devo dizer que isso até contribui com o senso comum atual de que mulheres tendem à multitarefa. Vejo gurias confirmando mais o que estão pensando ou não entendendo bem, porque pulam entre o filme e a realidade constantemente. Os caras tendem a pretar bastante atenção ou ignorar o filme completamente. Há meios-termos em todos os sexos - a natureza, desde bem antes do politicamente correto, paga seu tributo às cotas de alteridade -, mas a tendência a esse padrão me parece bastante interessante. Seja um macho uma fêmea querendo lidar com várias coisas ao mesmo tempo, no entanto, (adolescentes não parecem saber a diferença entre escutar ou olhar e "prestar atenção") a multitarefa naufraga quase sempre. Apenas "quase", porque há sempre exceções, como bem se sabe. Às vezes inclusive o sujeito até se interessa tanto pelo filme que assiste tudo e descobre-se pronto para entendê-lo (interpretá-lo). Mesmo assim, algumas confirmações tendem a ser pedidas.

De qualquer forma, até a adolescência, raras parecem ser as pessoas que entendem realmente a trama principal - e uma que outra paralela, quem sabe? - porque simplesmente não há atenção mantida por tempo suficiente para tal. Curiosamente, esse empecilhos para a interpretação em nada batem com a falta de espírito crítico que tanto se cola (em campanhas ideológicas) à capacidade de interpretação. É claro que uma crítica sem interpretação é infértil em muitos sentidos, mas quero chamar atenção para o fato de que a dificuldade de interpretação, seja qual for, não indica um espírito passivo ao conteúdo real ou pressuposto daquilo que é visto, como geralmente se quer pregar quando se diz que é preciso ensinar a população a interpretar para "ter espírito crítico", o que significa votar na mesma bandeira que a pessoa fazendo o alarde. Como vou comentar, é verdade que o espírito crítico em questão não é o ideal, mas ele está longe de indicar passividade e, mesmo que equivocado, não tende a ser muito apefeiçoado pela vida.

Depois da espécie de crença pétrea em bem e mal, certo e errado, a que se tende em determinada fase da infância (particularmente, não apenas de que isso existe mas de que se sabe exatamente quando estamos em frente a um ou outro), caminha-se para a adolescência, fase em que o voluntarismo infantil sobrevive, mas (porque já se sabe mais do que se sabia poucos anos antes) uma sensação de extremo conhecimento do mundo e da vida conquista a mente humana. O adolescente tende a um cálculo assustadoramente errado da cultura que recebe, interpretando "amor", "ódio", "vingança", "decepção", "nostalgia" e muitos outros sentimentos e conceitos cantados com louvor e ânimo por todos os lados restritamente conforme sua parca experiência, que lhe parece tão grande por ele já ter perspectiva para entender o quanto o horizonte das crianças é pequeno. Por contraste consigo mesmo, um adolescente parece ter pulado, em dois anos, de Sam Gamgee para Gandalf. Por isso mesmo, se julga mais conhecedor do que é. Por isso mesmo, de novo, acha que sabe do que sua cultura está falando. E assim sai errando cada passo e julgamento que dá, com exceção, é claro, daquilo que realmente entendeu por experiência própria, não por "herança discursiva", digamos.

Acima de tudo, é a partir da adolescência que conseguimos confundir o que queremos com termos como "justiça", "lei", "correção", "adequação", "respeito", entre outros, e fazemos tudo com alguma capacidade retórica. Dessa forma, nosso mundo autocentrado já passa a ter a possibilidade de, pela nossa palavra, passar por um descentrado, honesto, respeitoso, justo. Tudo que o filme, retalhado pela falta de atenção do espectador, apresentar e que, de alguma forma, contrarie o mundo ou interesse do jovem de qualquer forma, receberá uma crítica bastante sincera e enérgica. 

O objeto cultural em geral só será aceito nos termos em que ele confirme o que o jovem quer (espaço aqui para desejos inconscientes, é óbvio). De resto, apresenta-se espontaneamente o espírito crítico que tanto se deseja ver criado por educadores perfeitos que amam as crianças acima da própria vida, dispostos portanto a salvar a nação em troca de migalhas - ou seja, o espírito crítico como a postura que pressupõe a dúvida frente ao que se assiste e que coloca questões fortíssimas a tudo que lhe parece equivocado. 

Assim, não é preciso professores para isso; o adolescente é um animal extremamente "conservador", no sentido de desejar o seu conforto psicológico acima de tudo, portanto disposto a renegar tudo, esquerdista ou direitista, que o tire do lugar. Professores seriam necessários, talvez, para questionar esse espírito crítico, para provocar uma interpretação embasada e coerente, para mostrar que a coerência que interessa construtivamente é aquela que se pauta pelos elementos do que é analisado - não pelos nossos desejos, ou seja, que é preciso ser coerente com critérios lógicos ou objetivos de alguma forma, em vez de se ser coerente com o que queremos e ponto. (Professores, portanto, poderiam ser importantes para mostrar que muitas vezes o espírito crítico do aluno é o que está completamente equivocado, que ele ainda tem muito a aprender antes de negar tudo o que vê pela frente só porque quer, que é preciso escutar - postura aparentemente passiva - para se pensar como o outro a fim de poder questionar com razão, que o espírito crítico não é um valor se é infundado, autoelogioso e autocondescendente.)

Parece-me ficar claro, assim, que o humano tende a se manter adolescente pela vida afora. Não precisamos dos outros para sermos críticos, apenas de nossa própria cabeça. Precisamos dos outros, em geral, para entender que alguém pode ter razão além de nós mesmos e dos heróis que dizem aquilo em que queremos acreditar.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Rapidinha sobre Golpe do Paraguai

Se houvesse algum interesse em honestidade intelectual, nossa cena política só precisava de um dicionário, ou mesmo de um glossário.

O problema de se dizer que houve golpe ou não é, claro, só um problema de partido aqui. A ex-esquerda chama de falta e a neo-oposição-conservadora diz que o lance é válido. Agora, na tentativa de soar verdadeiro, correto, do lado da razão, da ciência ou da jurisprudência de fundo de quintal, as pessoas simplesmente demonstram que ninguém quis se informar muito sobre as palavras "golpe", "impeachment" ou mesmo sobre a qualidade de argumentos de qualquer dos lados no próprio Paraguai, para então se pensar se é possível aceitar esses argumentos sem se chamar o governo do Paraguai, agora e antes, de antidemocrático.

Seria o caso, enfim, de se alinhar conceitos antes de hastear bandeiras. Sei que o caso é velho e não estou dizendo nada demais aqui, mas fazia tempo que eu não postava, e não parece que ninguém tenha parado para simplesmente apontar o pequeno mas fundamental detalhe de que defensores e acusadores do Paraguai não estão nem tentando falar a mesma língua, mas juram isenção e honestidade... acima do outro lado.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Rio +20 e a política

Uma mulher no poder? Lá de onde eu venho não tem disso não...

Faltam dois dias para recebermos mais uma vez Ahmadinejad no Brasil! Ele vem por causa do Rio +20. Obviamente seu objetivo é "estreitar relações" com Brasil, um dos grandes países a aceitar seus crimes de Estado e o terrível sistema político do Irã. 

É um desafio para mim entender o que a proposta de um "mundo sustentável" tem a ver com perdoar um Estado teocrático daqueles. Mas, na verdade, nem entendi ainda como um país democrático (especialmente se o país se anuncia internacionalmente como democrático) recebe ditadores e assemelhados. Os governantes do mundo, porém, não apenas lidam bem com a situação como a repetem inúmeras vezes, com toda a tranquilidade. Os governos da América do Sul, então, são especialistas nisso (o Brasil tem até uma Associação de Amizade Irã-Brasil!!!). E o discursinho de um mundo diferente, possível somente longe dos EUA, sempre marca presença nas contorções retóricas que permitem esse tipo de amizade. Além do mais, com o que a Dilma já arregou para militares aqui, o que seria cumprimentar e conversar animadamente com a misoginia encarnada, né?

Por outro lado, contorções retóricas as temos para o principal problema: o programa nuclear iraniano. Até que se prove cabalmente que ele é mesmo militar, o Irã pode ser desculpado, por alguns, como inocente. Por isso, Ahmadinejad e seus companheiros não permitem de jeito nenhum que os países interessados analisem direito o que rola por lá. Nada suspeito, né?

O Mensalão também, se não for julgado, segue sendo uma acusação vazia. Para alguns... Curiosamente, para os mesmos que aceitam o segredinho de Ahmadinejad com seu urânio. Assim, nosso governo toma a mesma tática: atrapalha e atrasa a investigação a fim de impossibilitar a acusação cabal. 

Aqui, a acusação prescreve, e seguimos com a currupção impune. Lá, a acusação sem provas só tem prazo de validade até o mundo ir pelos ares.

domingo, 17 de junho de 2012

Negar a verdade por medo das consequências

"A escola é o último lugar para o jovem não se tornar um marginal"

A ideia é mais ou menos essa, mas foi resumida numa frase semelhante, que infelizmente não consegui encontrar na internet para citar aqui. De qualquer forma, o espírito da coisa é esse. Recentemente a vi citada para uma plateia de professores. Todos aqueles que não estavam apaixonados pelos clichês falados pela palestrante (e que estavam perto de mim, pelo menos) nitidamente se sentiam desconfortáveis com a ideia.

O problema, pelo jeito, não seria por constatar algo supostamente falso. O problema mesmo é que, se a afirmação for correta, a escola tem uma gigantesca responsabilidade... a mais. É uma daquelas situações clássicas ("das Humanas" eu ia dizer, mas nas Exatas isso também é verdade...) em que uma afirmação sobre a realidade é negada não por constatar uma falsidade, mas porque, como uma performativa, a consequência da frase é complicar ainda mais a vida da gente, então é melhor negar a proposição como ato, sem nem mesmo entrar no mérito de ela ser verdadeira ou não. Posto de outra forma: não se questiona a veracidade de uma afirmação que, se verdadeira, exige mais da gente.

Infelizmente, uma verdade não deixa de ser verdade apenas porque nos é desconfortável confrontá-la. Classicamente, aliás, uma verdade ignorada é exponencialmente mais perigosa que uma verdade enfrentada, pois continuamos combatendo as consequências dela como se fossem causadas por outros motivos, portanto atiramos para todos os lados, apenas com a garantia de nunca mirar no alvo real.

A ideia pode ser complicada, ou verdadeira apenas em alguns casos, mas a solução ainda é assumir que isso pode ser verdade e se analisar realmente o quanto a ideia funciona, não ignorar o que se constata para seguir com a cabeça enfiada na terra.

terça-feira, 12 de junho de 2012

A legítima defesa da velha e a depressão do policial

Recentemente, uma mulher de 87 anos matou um assaltante em Caxias do Sul. O cara estava em condicional, recém liberado, era reincidente, aquela coisa toda que a gente conhece... A mulher ontem foi presa por homicídio e posse ilegal de armas.

A princípio, esse fechamento é irritante, não? A defesa por legítima defesa e as outras razões legais para soltá-la virão depois. No momento, a polícia agiu conforme a lei, com um preciosismo típico de quando a pessoa (vítima ou agressor) não tem dinheiro demais. Exatamente essa diferença, nossa tendência a nos condoer pela velha e nosso constante susto ou opressão sob a violência das cidades (e Caxias é uma cidade muito violenta) nos levam a pensar que é injusto a mulher ser tratada dessa forma.

Mas eu vim aqui falar um pouco pelo diabo (no caso, a polícia), a fim de chegar ao meu ponto. 

Em primeiro lugar, eu me sinto, por um lado, feliz pela velha. Melhor seria não passar por algo do tipo, mas, tendo passado, antes se ver com a polícia e ter sobrevivido a um confronto com um assaltante que poderia atacá-la em sua própria casa que ser vítima desse cara e ter de esperar dias para a polícia, quem sabe, aparecer. Afinal, é mais fácil ser preso que ser socorrido por policiais.

Além da sobrevivência ao confronto, ela dificilmente será incriminada. A polícia não está exatamente procurando sarna para se coçar e reconhece, suponho, que a tal mulher não é exatamente o que está errado com Caxias.

Ainda assim, nos vem a ideia de que ela não deveria ser nem acusada. Tendemos a pensar que a mulher deveria ser ouvida pela polícia, receber um tapinha nos ombros por congratulação e voltar ao seu dia-a-dia, nem que fosse para lidar com o assassinato de outro ser humano como quiser, se isso é o tipo de coisa que incomoda aquela senhora. Bom, isso me parece otimismo desmedido, motivado pelo que consideramos hoje um final feliz: se o bandido na situação está morto, estamos satisfeitos, e supõe-se que nenhum problema advirá disso.

A polícia, no entanto, não pode partir de nenhum desses pressupostos. Em primeiro lugar, estão em frente a uma mulher que demonstrou que, aos 87 anos, é capaz de matar outro ser humano. Em segundo lugar, se a polícia acreditasse em aparências e primeiras versões, a impunidade seria ainda mais fértil que já é. Em terceiro, a arma ilegal estava na casa, mas supostamente não era da velha. Era de quem? Por que estava ali, se ilegal? (É possível entender que a arma era legal, mas ela não tinha direito de empunhá-la - a notícia, como é comum, não foi clara nessa parte.) Como disse, Caxias é uma cidade violenta, e não se pode dar ao luxo de não investigar questões como essas. Então, dessa vez, o "bandido" morreu? Isso não garante que, na próxima, o morto não seja um bandido, mas outro qualquer, ou a vítima se passando por bandido (que ainda seria incriminado por homicídio, claro). 

Ou seja, quando alguém morre, está certo a polícia parar tudo e lidar com muito cuidado com o assassino, mesmo que seja uma senhora de 87 anos que ia ser assaltada por um criminoso reincidente. Não é o contexto, mas a morte de outro ser humano que motiva o estancamento do cotidiano e o pisar em ovos frente às evidências do crime, até que tudo esteja bem claro. O problema é ainda quando a polícia NÃO age, e deveria. Agora, não é porque a polícia tende a ser ausente, pobre, desrespeitosa, corrupta ou incompetente que, quando ela não o é, deve ser acusada. Deixemos as críticas para quando ela está errada! 

O meu ponto, em tudo isso, era que, mesmo com as razões que aprensentei (sei que um juiz ou advogado incluiria muitas mais), o policial em geral deve sentir pelo menos uma tendência a essa empatia que nos faz reclamar da polícia por incriminar a velha (note-se, incriminá-la pelo que ela fez!). O policial, além disso, tem conhecimento da falência da polícia com uma profundidade que nem suspeitamos e precisa conviver com as ironias de ver tanta miséria na profissão e, ao mesmo tempo, uma velha sendo presa por defender sua casa. 

Escrevi este post para dizer, então, que é nesses dias que o cara precisa amar demais o seu trabalho. Pois é preciso ser muito ético, ou gostar demais da profissão, ou as duas coisas, para prender uma velha nessa situação e não se deprimir com o que se escolheu fazer da vida.

terça-feira, 5 de junho de 2012

O blog como problema

Shhhhh - blog dormindo só um pouquinho!

Quando criei este blog tinha mais tempo e quase ninguém com quem conversar. O Orkut não servia bem para essas coisas... O Face e o Twitter não haviam ainda sugado todas as energias verbais das pessoas (além de que eu não tinha conta neles), de modo que alguns conhecidos tinham e mais ainda liam blogs.

Comecei as publicações sem grandes ambições de ser lido, apesar de acreditar que umas três pessoas pelo menos iam conferir, já que tinham me motivado tanto a começar um. Eu era muito ligado em retórica jornalística e papos de ônibus (sempre para debochar da forma como as ideias eram expressas nesses meios). Com o tempo, no entanto, essas duas coisas foram sendo superadas.

Entre um comentário de filme ou alguma reclamação sobre a vida acadêmica, que voltara a me consumir com algumas cadeiras obrigatórias novamente, as viagens de ônibus foram diminuindo, os papos foram se repetindo, e as notícias foram me levando para alguns comentários políticos. Nessa época eu escrevia pelo menos um post por dia (algo que se manteve, creio, por mais de dois anos), então não me tocava muito sobre as pequenas curvas que minha seleção de assuntos fazia. 

Isso foi se reforçando até a eleição da Dilma. Repentinamente eu me toquei o quanto tinha deixado de comentar retóricas ridículas de outros campos, e comecei a tentar resistir a escrever sobre política. Não fui muito feliz no esforço, mas algum resultado houve. Só que, na verdade, uma nova respirada de tempo me fez desviar para política internacional, já que pude começar a ler uma série de jornais pelos quais sempre tivera curiosidade (ou retomar alguns de quando estudava línguas estrangeiras).

Depois do primeiro ano de certa uniformidade e um aumento mais ou menos significativo de visitas, todos esses movimentos foram a receita para ter cada vez menos leitores, creio. Conforme eu não mantinha uma linha, quem gostasse de um post podia passar muito tempo sem achar nada de relevante no blog. Não criei relações que vi vários outros blogueiros criarem com gente que escrevia coisa parecida, bem como não abri o site para muitos conhecidos ou amigos, já que minhas críticas podiam insultar muita gente e eu estava mais preocupado em colocar as ideias pra fora do que em tornar todas as minhas relações super-honestas.

Este blog, portanto, não tem tema, a não ser formal (retórica ridícula), sendo que nem esta questão formal é necessária em todos os posts. Mesmo assim, quem gostava ficava, aparentemente, e eu via pelo menos um rastro de um certo trânsito no blog. Quando eu comecei a rarear, porém, até essas pessoas devem ter parado de procurar muito o site, já que eu parecia ter abandonado o barco. Ou eu perdi o tom, quem sabe? Talvez elas também tenham se ocupado mais, ou tenham entrado na mesma onda de descarregar a energia leitora-escritora no Face.

Acho que 6 pessoas, na melhor das hipóteses, ainda leem este blog, nem todas vindo realmente no site, mas recebendo o post no e-mail. Assim, nem estou aqui falando sozinho, nem realmente criando um texto com possibilidades variadas de leitores. Então não seria mais adequado criar uns e-mails com vários destinatários, contando novidades em vez de comentando bobagens (o que se faz monologicamente só com vários leitores ou com nenhum) e abandonar o negócio de vez?