segunda-feira, 5 de julho de 2010

Viva a derrota!

Nunca fiz uma análise muito detida do jornalismo das décadas de 1950 a 1960, mas, por tudo que se narra e pelo que aprendemos em História ou vemos em documentários, parece-me que a imprensa mudou radicalmente sua postura frente às seleções nacionais. Ambas as posturas são características de nossos torcedores, mas a imprensa era antes daqueles que torcem, empurram, apoiam, querem o título e o melhor para os jogadores e o técnico. Agora, os jornalistas encarnaram o aspecto dos torcedores que se quer especialista em futebol. Todo mundo é chamado a argumentar como autoridade e, nisso, preferem malhar e urubuzar tudo que podem, acumulando tantos comentários maldosos e mal embasados ou infantis que não podem ser compensados por torcerem na hora do jogo. Aliás, durante o próprio jogo as críticas constantes denotam que os jornalistas não são mais narradores nem cronistas de futebol, mas críticos escolados no senso comum e na observação que qualquer pessoa que curte futebol consegue fazer. Os jogadores e árbitros convidados, claro, mais ou menos balançam essa má-vontade e essa petulância, mas não é suficiente para inverter o tom geral das notícias que acompanham a preparação para a Copa.

Quando a seleção perde, no entanto, surge o apoio. Surge o carinho, a valorização! Mesmo Dunga recebeu abraços e beijos, bem como palavras medidas e ponderadas na imprensa, agora que perdeu. O que aconteceu entre aquele primeiro bloco de vitórias e as Copas dos anos 1990 em diante?

Tudo mudou, é claro, mas, para me ater ao futebol, parece que a onda de derrotas deu confiança aos urubus. Eles xingavam, mais e mais, e o Brasil perdia. Ora, eles só podiam ter razão. Suas críticas só podiam ser fundamentadas. Mais do que isso, deve ter havido alguma mudança no ibope, que pelo menos favoreceu, ou pareceu favorecer, críticos que metralhavam a seleção de cima abaixo antes de o time embarcar. Seja como for, o xingamento ganhou espaço, e a imprensa que apoiava e torcia pela seleção, deixando para criticar se perdêssemos, virou a que critica para depois apoiar, caso percamos. Não acho que é o caso de se apedrejar a seleção que perde, mas também não fingi que a apedrejaria enquanto estavam se esforçando para vencer.

Considerando-se que ganhamos três de quatro Copas do Mundo (1958, 1962, 1970) e que tínhamos Pelé, obviamente criou-se a ilusão de que nosso futebol é o melhor do mundo, que somos o país do futebol, como a Itália é o da massa e os EUA são o da democracia. Ingleses, mesopotâmicos e gregos inventaram essas ideias? Grande coisa! Nós concretizamos o potencial de suas criações como nunca antes se tinha visto.

Mas já se foram os dias de Pelé, de Washington ou dos superinventivos cozinheiros italianos. Surfamos na onda de personalidades que marcaram nossas culturas, e a distância do passado glorioso não deixou de criar a mágoa de um discurso ao mesmo tempo triunfalista e ressentido, pronto a proteger na derrota para acalentar o sofrimento e não deixar que ele mine discursos heroicos, que devem permanecer vivos, a fim de que cada povo possa viver no mito de sua nação.

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