domingo, 15 de maio de 2011

Uma Babel de judeus e professores

O que me chamou a atenção mesmo nos bafafás sobre o metrô de Higienópolis e sobre o livro do MEC que "ensina o erro" foi o quanto as duas discussões não evoluíam, independente de quanta informação nova fosse publicada.

No caso do metrô, as versões que corrigiam equívocos sobre a origem da informação preconceituosa, o quanto ela seria ou não representativa daqueles que não queriam o metrô, os motivos por que a prefeitura teria mudado o planejamento da obra, a "indiferença" da "gente diferenciada", o extremo antissemitismo de alguns críticos aos "moradores do bairro" (o que ficou por isso mesmo, aliás)... nada fazia com que nenhum dos lados tentasse se retratar ou responder às críticas do outro. Basicamente o que aconteceu foi que as pessoas pegaram as bandeiras no início da conversa e seguiram adiante, cegas e surdas a quaisquer novas informações.

É óbvio que é muito mais divertido fazer barulho por nada que discutir um assunto e chegar a uma solução adequada, realista, ponderada e útil, então não é estranho que o assunto tenha se desenvolvido assim, mas achei curioso os mesmos dias serem recheados por outra discussão que não evoluía, a do MEC. 

Depois da gritaria internética "MEC distribui livro que ensina o erro", as informações começaram a aparecer. Aliás, todas aos pedaços (como as sobre Higienópolis - é a maior dificuldade tentar contextualizar quando e como cada coisa foi dita ou escrita). Juntando as citações cortadas, ao que me parece a situação é esta: o livro deixa aberto ao aluno falar como quiser, desde que tenha consciência de que existe uma relação direta entre adequação e aceitação (o que implica que ele deve aprender a variante mais conceituada - ou seja, o livro não defende que o aluno fique na ignorância).

Não vi citações diretas do livro afirmando que se possa escrever de qualquer forma. Só achei críticos do livro acusando-o de afirmar isso, só que baseados naquelas citações que tratam da fala. Sendo que, tecnicamente, o livro não defende que se fale errado, só disse com todas as letras o que há muito guia a educação nacional: a fala deve ser adequada a cada contexto e não é uma tradução da escrita, nem vice-versa. Podem até discordar disso, mas por que estouraram agora? Só agora um livro foi tão didático que entenderam que era isso que estava sendo dito há anos?

Mesmo assim, defensores e detratores do livro pegaram suas bandeiras clássicas e começaram a extrapolar que aquilo que cada um defendia (ou combatia) era o que estava escrito. A confusão foi tanta que Pasquale apareceu citado como um dos críticos, só que ele falou (com entonação de pessoa ponderada) exatamente a mesma coisa que está no livro. 

A única pessoa que parecia saber bem o que estava discutindo era o Bechara, que, ao criticar o livro, criticou também os PCNs, já que o livro segue o que está traçado lá. Ora, se livro e PCNs concordam, a grande revolta que está estourando agora deveria ter explodido há muitos anos. Claro, se algum desses defensores da língua e da educação se interessasse pelo assunto para além de modas de twitter. A evolução e a resposta dos responsáveis no MEC só pioraram a discussão, já que se começou a acreditar que o que eles tinham dito estava escrito no livro, o que nem sempre era verdadeiro. 

Ou seja, a internet até promove debate e discussão de um monte de coisas que não costumavam ser debatidas assim diretamente, em larga escala. Mas a discussão sobrevive só como discussão. Ela não evolui, não importa quantos novos fatos sejam publicados: a Folha obviamente não acusou nenhum golpe das graves críticas que a Veja lhe fez, assim como Taz não tremeu com o que certamente viu sobre sua reação ter sido apressada e desinformada. O MEC virou vilão sem mudar de postura há décadas, e o livro é criticado e defendido sem que ninguém saiba bem o que está nele. Assim vamos, debatendo sem razão, sem conhecimento e sem sentido.

2 comentários:

Vida disse...

Amei o texto. Não entendo o pq do estardalhaço em cima do q n se sabe. Analisam, mal, 2 pag do livro e fazem um escândalo. Pior que, em minha opinião, pelo pouco que vi, enfim um livro faz o que eu tanto discut com meus alunos de pedagogia:fala sobre o respeito à variação.

Tigre disse...

Pois é. Acho que a maioria das pessoas não vê que os alunos, se aprenderem a variante culta, não vão migrar para essa outra língua. Se eles falam um dialeto diferente do culto, este será sempre, lógico, uma ESCOLHA para eles, algo consciente. É o culto que é "diferente" para os alunos, às vezes MUITO diferente.

Dizer que devem falar o português culto porque é certo, e não porque é o prestigiado socialmente, é querer que se ensine aos alunos uma mentira, que se trate a todos como imbecis e que se os mantenha, nesse sentido, numa ignorância também. Por outro lado, ensinar que devem falar o culto porque é a variante prestigiada é, como eu disse, apresentar uma escolha para os alunos, não uma doutrina.

Que bom que amou o texto. Muito obrigado.