quarta-feira, 9 de março de 2011

Ignorância

É uma reclamação comum (pelo menos entre geeks) que a Física do colégio termina, na melhor das hipóteses, no século XIX. Tem me parecido, no entanto, que isso é de estranhar apenas no século XXI (porque a discrepância é gigante demais). Fazia sentido no século XX, ou, no mínimo, representava um padrão bem comum: quando o assunto é conhecimento partilhado, estamos sempre um século atrás. 

A coisa é pior quando o tema é ideologia e sociedade: as mentes mais brilhantes, ou em posição mais poderosa, também estão sempre correndo atrás da carroça. No século XX, as táticas eram oitocentistas demais para prever os resultados dos combates das guerras mundiais. As máquinas de guerra tinham evoluído para além do que se compreendia na teoria militar. Nenhum contemporâneo parecia ter muito o que dizer a respeito da destruição causada. Não parecia nem mesmo entrar na cabeça de ninguém o quanto nossa imodesta raça tinha destruído, em sua paisagem e em si própria. Nem entremos no resultado da bomba atômica ou da ida à Lua.

No século XIX, o progresso tecnológico virava quase que imediatamente religião. A "intelectualidade" vivia embebida pela autoimagem de Prometeu enquanto cavava a própria cova. No XVIII, ninguém previra realmente a Rev. Francesa tal como se desenvolveu, ou suas consequências mundiais. A Independência Americana (até onde eu sei) era um prenúncio bizarro de um dito futuro de liberdade, sem que ninguém tivesse entendido o presente.

Quase nenhum ser humano sabe explicar como funciona o ipad. Mas nenhum parece saber explicar as revoluções árabes, o estágio-Obama dos EUA, o Islã ou mesmo o futebol no caso do Brasil. Os que tentam, o fazem a posteriori. Mentes individuais levam nossa técnica adiante, mas nem indivíduos nem grupos conseguem dizer para onde vamos. É verdade que, em muitos sentidos, o discurso funda a realidade que busca descrever, mas isso acontece em grande parte porque, na ignorância real do que está acontecendo, nosso instinto é puxar a brasa para o nosso assado, torcendo que a verdade seja a nossa verdade.

Não é só a Terra que viaja por inércia, sem rumo, no vácuo. Nós herdamos sua cegueira.

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