sábado, 19 de março de 2011

Educação e egocentrismo

Um charuto é artefato raro, ainda mais de se ver no ônibus. Ainda mais se o sujeito o sustenta na boca sem que esteja, pelo menos, aceso. Agora, pior ainda é quando o cara, que chamou a nossa atenção pelo jeito estranho, completado com chave de ouro pelo charuto na boca, reconhece a gente e vem conversar!

Eu absolutamente não lembrava do cara, mas ele deu indícios rapidamente que comprovavam a veracidade de seu protesto de me conhecer. Ok. Bom, o cara também só falava, ele não dialogava. Ou seja, ainda que eu não lembrasse dele, isso não fez muita diferença. 

Seu automatismo linguístico me permitiu observar de forma mais detalhada que ele parecia estar vestido de forma absolutamente oposta à minha. Aparentemente estávamos próximos, ele de sapato, calça jeans e camisa, eu de sapatênis, calça de sarja e camisa polo. Mas, de alguma forma, éramos o exato oposto um do outro. Ele nitidamente fruto da escola em que nos formamos (de onde ele lembrava de mim), eu... bom, não sei o que parecia para ele, mas tinha plena consciência naquele momento de não expressar fisicamente ter me formado lá. Além disso, acabei falando, num milésimo que tive para dizer algo, que tinha feito Letras... aí, já viu!

Bem no fim da "conversa", ele disse que ia para os EUA, queria estudar lá. Conforme ele, formação é algo muito importante e a educação no Brasil "não dá". Fiquei olhando para ele e pensando "Estudo, vá lá, mas 'formação'? Tu não é meio velho para isso?" É claro que isso se pôs assim para mim porque ele se referia propriamente à formação universitária como aquilo que inicia nossas carreiras, mas a escolha da palavra também me encucou, porque há uns dois anos ando às voltas com a ideia humanista de formação pela educação e os traços culturais que herdamos de certos ideais daqueles tempos. Pareceu-me particularmente estranho, ainda por cima, um sujeito que não sabia escutar dizer estar interessado em aprender algo de fontes humanas, como professores. Mas, tomara, não nos veremos mais, e ficará apenas a imagem estranha de um estranho com cigarro na boca passando na roleta e me reconhecendo.

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