terça-feira, 4 de maio de 2010

A mudança de assunto patológica como desenvolvimento do prazer e suas nefastas consequências sociais no mundo pós-moderno: um estudo breve

Falamos para o nosso próprio prazer. Sendo a fala um ato masturbatório, a conversa, obviamente, é o sexo. Infelizmente, muitas pessoas transam consigo mesmas, mesmo quando estão acompanhadas na cama, e, naturalmente, isso também é verdade quando o assunto é linguagem.

A retórica, suposta arte de bem falar ou de convencer, facilmente é usada sem seu alvo típico (o interlocutor), a tal ponto que poderíamos parar muita gente no meio de uma conversa e perguntar "Oi! Tu tá tentando convencer quem?", já que a pessoa insiste em apresentar argumentos que convencem apenas a ela mesma e se nega a escutar que nós NÃO estamos aceitando nenhuma ideia apresentada como válida.

Esse problema do "argumentador" que ignora aquele que o contesta (o argumentador masturbatório - nomenclatura de paradoxo intencional) é particularmente presente na raça dos políticos profissionais. Entenda-se claramente que por político profissional eu não penso apenas em quem busca voto ou tenta justificar publicamente suas ações como medidas de interesse social. Incluo nessa categoria todo aquele que trabalha diretamente para esse tipo de político ou todo burocrata, secretário, assistente ou coordenador que não encontra diretamente o público-alvo de sua função. O político profissional da saúde não costuma encontrar um doente, o da educação não costuma encontrar um aluno, o do saneamento só vê a rua quando sai do trabalho. Esporádicas visitas de "acompanhamento" (se forem, na verdade, vistorias dos empregados, não das necessidades sociais relacionadas), festividades e inaugurações não contam.

O político profissional, geralmente mais cara-de-pau que outros tipos de argumentadores masturbatórios, tende a elevar os desvios de assunto à máxima potência. Ele simplesmente usa a primeira frase para desviar o referente. Se falamos em crianças pensando num ser humano de 6 anos de idade, da classe média, já matriculado em uma escola particular, qualquer um desses quesitos é distorcido ou desviado para uma criança a quem necessariamente não se aplica o que dissemos e, melhor ainda, que ÓBVIA, porém implicitamente, não era nosso referente. Alguns minutos então são perdidos com demagogias, platonismos, clichês e, se possível, promessas vazias e incompletas. Nota-se cotidianamente que os políticos profissionais costumam usar essa estrutura "argumentativa" contra outros de sua raça, mas não se trata de mera moeda corrente ou desrespeito com os colegas: a argumentação masturbatória é um sintoma patológico entre eles. É bem provável que a única forma de forçar um indivíduo dessa espécie a manter o assunto discutido envolva total imobilização física e algum tipo de ameaça grave à genitália.

É fundamental ressaltar que o prazer do ato da fala não é o único motivador desse comportamento, ao menos não nos indivíduos aqui tematizados. O político profissional fala não para o interlocutor, mas para a plateia, o que inclui seu próprio ouvido. Na verdade, ele fala para uma plateia mesmo que ninguém mais esteja presente, e o aplauso dela, se houver, é apenas um eco do auto-aplauso de seu ego. Como disse, a "arte de convencer" não se aplica aqui, pois NEM um político que fale diretamente para a plateia apresentará argumentos adequados para ela. Deve-se esquecer o obtuso conceito de "argumentação" e se pensar apenas em resposta emocional. Esteja um público lá ou não, razão e coerência estarão irremediavelmente descartadas.

Se alguém fala assim sozinho, o que afinal o diferencia de um louco, em especial daqueles mendigos, por exemplo, que discutem ou se divertem com companheiros que os demais mortais não enxergam? Timing! O controle do tempo (geralmente inconsciente) marca o limite entre a política e a loucura:

* O político fala sobre referentes errados e, até onde puder, sem coerência alguma, até ter gastado o tempo adequado às manifestações de quem seja, de modo que nada se resolva. O louco entende equivocadamente os arbitrários parâmetros de tempo da sociedade, falando sobre sabe-se lá o que mesmo quando as outras pessoas não lhe reconhecem o direito de tratar (bem ou mal) sobre aquele assunto.

* O político fala sozinho na frente de outra pessoa que fala sozinha virada para ele ou no mesmo momento e contexto em que alguém, geralmente não político profissional, tenta travar um diálogo como o entendiam os otimistas filósofos da Grécia Antiga. Mesmo que esse interlocutor puramente formal não exista, o político fala justamente no momento arbitrariamente estabelecido para que uma plateia alucine que ele está falando com ou para ela. O louco fala sozinho justamente quando as outras pessoas não acham que ele fala com elas (não houve preparação formal adequada para determinar turnos de fala).

Observe-se que a masturbação política em um "debate" é recebida por aplausos, particularmente porque a combinação pornográfica de duas pessoas que fingem transar (quando, na verdade, apenas interpretam um dos dois papéis sexuais clássicos - atividade e passividade) estimula catarticamente o público. A masturbação fora de hora (preconceituosamente motivadora de que se taxe de louco o argumentador masturbatório que teve menos privilégios sociais ou de sensibilidade ao tempo) provoca uma reação de pudor, tipicamente denotada pelo transeunte virando o rosto ou tapando sua visão, mal reprimindo uma íntima sensação de vergonha.


PS: Qualquer alusão às minhas leituras recentes de Freud para se justificar este post são intriga da oposição.

3 comentários:

Carla M. disse...

Me pergunto se o indivíduo que tenta intervir no ato masturbatório da fala, respondendo a alguma afirmação de forma a protestar sobre o próprio ato tem como resultado o de gerar algo como um coito interrompido ou apenas, e tão somente, impossibilitar o prazer alheio.

Por que se for a última hipótese, vou seguir realizando intervenções debochadas em discursos políticos chatos.

Tigre disse...

Pela cara que fazem quando são assim interrompidos (lembro em particular de uma irritação intempestiva contra mim que marcou todos os colegas presentes - rs), acredito que as duas hipóteses sejam verdadeiras de forma mesclada.

gabi disse...

nas duas primeiras frases observei traços das recentes leituras...que influenciável!