terça-feira, 19 de outubro de 2010

Nas cotas dos outros

Arrisquei hoje no almoço utilizar entre 6 debatedores um argumento contra as cotas raciais que uso apenas se estiver conversando só com uma pessoa. Na verdade, é sobre o conceito de "dívida histórica", mas ele se desdobra numa crítica maior às próprias cotas. 

Não uso o argumento em debates grupais pela extrema facilidade com que termos que utilizo, como "metafísico", poderiam ser imediatamente mal-interpretados e causarem reações de horror, além de críticas violentas por pelo menos dois minutos, até que eu conseguisse acalmar os ânimos e fazer com que escutassem o que eu estaria efetivamente dizendo, negando as pressuposições sobre o que imaginariam que eu estava dizendo. Como é infinitamente mais comum que uma pessoa esteja disposta a escutar que 2 ou mais, especialmente se se está a todo momento competindo pelo turno da fala e pelo argumento mais poderoso, sempre imaginei que minha crítica não veria jamais o dia de se arriscar ao apedrejamento da discussão acalorada de um grupo. No entanto, hoje arrisquei, talvez por estar muito confortável na conversa. A reação foi aquele alvoroço, incluindo o equivalente étnico de "tu fala isso porque não é contigo" (com o pressuposto de que a escravidão É, não FOI - ops, já me arrisco a mal-entendidos, fiquemos por aqui na questão).

Bom, o argumento funcionou, acabei fazendo com que entendessem as falhas que eu queria expressar no raciocínio de "dívida histórica", mas eu estava discutindo cotas na Dificuldade 1, ou seja, a negra e a mulata presentes estavam do meu lado do debate. Talvez seja a hora de aumentar o nível de dificuldade.

Comemoração à parte, no meio da conversa uma das minhas amigas acrescentou um comentário interessante (partindo da questão de as cotas serem afirmadas como "políticas provisórias"): minha amiga foi das pessoas que cadastrou a primeira leva de porto-alegrenses para o Bolsa-Escola. Nesse cadastro, estava claro e explícito que o programa era provisório. As transformações que os programas sociais sofreram até virarem o Bolsa-Família (que os dois proto-presidentes pretendem manter e defender, é claro) fizeram com que essa "provisoriedade" nunca pudesse se realizar, pois há novos e novos cadastros em novos e novos programas. Os novos programas evitam a dissolução dessa "solução social", e a promessa de décimo-terceiro para os beneficiados apenas comprova que a política "provisória" acabou efetivada.

Nenhum comentário: