quarta-feira, 29 de julho de 2009

Crime & Tradição em Porto Alegre

A província tem novamente motivos para se alegrar com seu desenvolvimento. Finalmente o uso de pombos-correios para carregar tecnologia para presídios foi copiado de São Paulo e Rio de Janeiro. Como isso foi descoberto? Competência da polícia? Não: incompetência do pombo.

Aves mancomunadas e vis nunca haviam sido pegas antes. Nem havia suspeitas. Como sempre, tamanha taxa de sucesso é a receita da vaidade. O pombo que acaba de sujar o nome de sua profissão parou para roubar a comida dos cavalos da Polícia Montada. Não conseguindo lidar com o peso de sua mochila (1 bateria e 1 carregador de celular) para novo voo, caiu no telhado da própria polícia e feriu as duas asas!

Não acredito que a vaidade do pombo fosse mera autoconfiança, no entanto. Na verdade, o ato todo tem um caráter de manifesto aos meus olhos, talvez porque tenha vivido uma luta épica com uma lagartixa pela manhã, o que reforçou minha confiança na garra e na coragem gaúchas tanto de animais quanto de humanos (afinal, a lagartixa resistiu, mas EU ganhei - e falo de uma épica à Basílio da Gama, nada camoniano ou homérico).

Voltando, esse pombo tem todo o jeito, pra mim, de um vanguardista (e a face insolente do animal está registrada - Google - em várias fotos para quem quiser julgar por si). A importação de ideias do eixo Rio-Sampa é o primeiro traço característico. Não há originalidade fundamental: o vanguardista é simplesmente aquele que reconhece o novo e faz o trabalho sofrido de abrir caminho para as novas práticas em seu próprio ambiente. O deboche de parar para roubar militares é obviamente uma afronta, comida pelo chão é o que não falta em Porto Alegre. Roubar de cavalos, por sua vez, é uma nítida referência ao gauchismo burguês de CTG. A Tradição negada deve ser debochada. A frustração do plano dá o tom necessário de paródia. Seu sacrifício sela (trocadilho proposital do pombo com a Sela do cavalo e a Cela do preso) o destino vanguardista: frustrado em sua própria prática, a imitação futura e a memória heroica do ato são toda a recompensa de que o Inovador precisa.

O Estado tenta, obviamente, diminuir o heroísmo com um otimismo para o status quo. Um major entrevistado afirma que as vistorias e o controle do presídio estão indo muito bem se os detentos estão precisando buscar formas tão criativas para importar seu equipamento de trabalho (ok, essa escolha de palavras não é dele...). É engraçado apenas que, sendo o Presídio Central um paradouro muito querido dos pombos, e tendo SP e RJ já esse costume, a polícia nunca tenha pensado que ocorreria aos presos gaúchos imitar Estados que têm tradição em exportar Inteligência. Nova expressão da nossa Tradição, a polícia está prontamente cuidando do problema após a ocorrência.

3 comentários:

Bianca Pêra. disse...

Eu acho um absurdo, mesmo que em âmbito pombal, um gaúcho copiar ideia de um paulista ou carioca. Como se as ideias mais criativas e úteis não saíssem daqui. Por mais inovador e "pra frentex" que esse pombo seja, talvez se ele tivesse seguido seus próprios métodos, hoje ele estivesse com as duas asinhas.

Leo disse...

pô Tigrão, muito bom esse post! fiquei curiosa pra saber a epopéia da lagartixa... travei algumas inesquecíveis lá em Floripa, porque eu não queria a lagartixa dentro de casa, e não queria matar a bichinha (porque elas comem os insetos, e porque deve dar uma melequeira), então tinha que tentar convencer elas a saírem pela janela...

Tigre disse...

Eu devo admitir que sou muito pró-lagartixas. Esse foi um caso muito especial. Mas eu dei um jeito de matá-la sem fazer melequeira nenhuma. Se ela não tivesse largado o rabo, aliás, teria saído da minha casa em um pedaço apenas.

E, Bianca, quanto à cópia das ideias do Centro do país, realmente a tua mensagem aflorou meu bairrismo. Viva o RS, tchê!