Na base de uma ponte que atravessa a av. Ipiranga, estava pintada a seguinte mensagem: "A FAZENDA BRUTAL É NOSSA!" Eu estava um tanto longe da pichação, e esta ficava torta para eu ler, mas ela me chamou a atenção por desrespeitar o Ato Pelo Pretinho Básico das Pichações de Porto Alegre, que comentei há poucos dias. Só depois de pensar isso sobre a cor efetivamente li a mensagem. Fiquei intrigado por seu sentido enigmático.
Graças à matéria insistente e repetida do Correio sobre seus eventos para comemorar novo apresentador da Record, estava com a existência do programa "A Fazenda" ainda fresca na memória, e parecia haver aí uma reclamação quase de orgulho indicando que viver nas ruas de Porto Alegre é que era provação, isso seria a dura reality. Esse pensamento foi veloz, e ainda assim pensei com força "Não pode ser, dã!" No entanto, seria crítica política? Reivindação dos serviços públicos da Fazenda, que devem atender ao povo e não aos políticos? O equivalente sem-teto do Ministério da Fazenda é brutal?! Não tinha jeito, eu ia ter de sair da parada e caminhar até uma posição tática para leitura.
Descobri então que a cor do texto realmente deveria ter me dado a chave para entendê-lo. Não estavam simplesmente evitando o preto. Havia-se escolhido o vermelho! A mensagem era "A FAZENDA SHOUTAL É NOSSA!" (ou seja, a "fazenda Southall", onde um membro do MST foi morto há pouco).
Muito mais sentido: uma pichação que não atinge porcaria nenhuma, pois está escrita onde políticos e derivados em geral (os quais não dariam a mínima para uma pichação, claro) não vão vê-la nenhuma vez na vida, e ao mesmo tempo uma mensagem que tanto afirma uma fantasia quanto contradiz o discurso (de representantes oficiais) do próprio MST. Ou seja, tecnicamente, a pichação faz o desserviço de reproduzir como se fosse do MST um discurso que é projetado nele por quem é contra, complicando ainda mais a situação. Eis uma verdadeira pichação "engajada", que mira sempre na utopia de uma afirmação que pudesse ser puramente performativa sem ter sentido algum, um soco ininterpretável.
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