Faz tanto sentido ter a palavra "acordo" no "Novo Acordo Ortográfico" quanto ter a palavra "Unidas" no nome da ONU. Essa ideia toda de pessoas concordando, encontrando meio-termos, fazendo concessões e ao mesmo tempo tendo voz é, pelo jeito, demais pra pobre da cachola humana mesmo. Que o diga quem foi a Copenhagen recentemente.
Talvez eu esteja sendo muito condescendente se disser que, no Brasil, umas vinte pessoas eram a favor do Acordo. Classe, etnia ou gênero algum tinha interesse nisso além dos diretamente envolvidos no planejamento e dos vendedores de dicionários e gramáticas (não contados nos 20 acima, claro, já que seu interesse vinha do mercado e não de opinião filosófica a respeito). Quem não fazia ideia do que era o tal negócio, quando lhes era explicado, soltava um pff ridicularizante pelos lábios e torcia a boca criticamente para já em seguida xingar os políticos.
Apesar de ser um bom brasileiro (ou seja, ter memória curta), lembro que os defensores, contra todas as críticas, levantavam uma última bandeira: nós estamos liderando o processo. Retratando o Brasil como um país que sempre vai na onda dos outros, o pessoal achava que levar uma merda adiante era bom porque, pelo menos, nós estávamos encabeçando a ação internacionalmente. Para variar, esse "nós" se refere a uma ínfima reunião de pessoas, mas isso não vem ao caso no momento. O que vem ao caso é que, pelo jeito, todo esse "nós" apostou no cavalo errado: lançamos a bosta, mas ela era de curto alcance. (Nem pra acertar no ventilador, Brasil?)
Enquanto nenhum outro ratifica a coisa de verdade, além do Brasil, Portugal, que ainda guarda o maior peso simbólico, pelo visto, tem fortes movimentos de resistência. Jornais relutam, o sistema de ensino não adota mudanças, intelectuais protestam. Vasco Graça Moura levanta um argumento para seguir lutando contra: se é um "acordo", qualquer país que não aceitar tira a razão de os outros fazerem a reforma; José Mário Costa responde com argumento nenhum: "Não há possibilidade de recuo. O acordo está em vigor."
Note-se que Vasco usa pressupostos democráticos para desmerecer o Acordo. É por isso, claro, que o processo andou apenas no Brasil. Nem damos bola para nossa pobreza como alguns países africanos nem entedemos o que sejam pressupostos democráticos. Tanto que, em Portugal, 57,3% dos cidadãos não aceitar a reforma é referência para discussão. Francamente, quantos porcento dos brasileiros (ainda que contando apenas os alfabetizados) são contra o Acordo? Que valor isso teve? Todos ignorados por uma merda que reaquecerá nosso mercado fazendo com que, sendo otimista, 1% de nossa população total compre dicionários novos, sabe-se lá quando?
Não creio que a bobajada toda vá dar para trás, realmente. Acho que a mudança ainda pega, nem que seja como regras vigentes apenas no Brasil e num que outro desses países, e então nosso pioneirismo ficará gravado na história por um "mas": somos os líderes de uma palhaçada, mas pelo menos somos os líderes.
Um comentário:
Ninguém segura esse país...
(PAC - Programa de Acordo e Concordância...)
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